Introduziu o código no teclado numérico e o portão, para sua surpresa, abriu com suavidade. Esperava, pelo aspecto antigo, ouvir um ranger esforçado, mas não! Abriu quase sem ruído perceptível. Entrou e o portão fechou sozinho atrás de si.
Olhou para a mansão. As
fotografias que tinha visto não faziam justiça à imponência frondosa do mármore
trabalhado. Toda a frente, pelo menos, fazia lembrar uma catedral manuelina em
miniatura, cheia de motivos e simbolismos que não lhe interessava agora
deslindar. Apenas se sentia cansado da viagem e queria descansar um pouco.
Enquanto se dirigia à porta,
esta abriu-se e de dentro da casa saiu um indivíduo que, à primeira vista,
quase o divertiu…
Baixo, com um fato claramente
de pronto a vestir que não lhe assentava muito bem, gordo para além do
razoável, uns óculos enormes com lentes que pareciam ter saído do fundo de uma
garrafa de refrigerante, profusamente suado… O homem parecia ainda mais uma
caricatura ao vivo do que nas fotos que tinha visto.
- Sr.
César? – Perguntou.
- Sim!
- Victor
Antunes. É uma honra conhecê-lo finalmente em pessoa. Cumprimentaram-se com um
aperto de mão não muito firme, cumprindo uma mera formalidade.
- Espero
que tenha tratado de tudo…
Está tudo conforme
especificou. O carro está na garagem e já está legalizado, tem o seu escritório
todo montado, amanhã apresentar-se-ão aqui a sua secretária pessoal, que eu
escolhi pessoalmente conforme as indicações que me deu, e o restante staff da
casa.
- Muito
bem! Presumo então que hoje tenha a casa toda para mim.
- É
correcto. Estará completamente só. Quer que eu lhe mostre a casa?
- Não
há necessidade. Eu… – a sua falta de vocabulário fazia-se sentir – …i’ll get my
bearings! Pode retirar-se.
O homem tirou um envelope do
bolso e entregou-lho.
- Só
hoje de manhã é que o alarme foi instalado. Estes são os códigos. As suas
roupas já estão arrumadas no roupeiro do seu quarto, no segundo andar. Espero
que fique agradado.
César limitou-se a assentir com
a cabeça e o homenzinho retirou-se de imediato, dirigindo-se ao portão e
saindo.
Sabia-lhe bem o ar puro e
fresco à sua volta, por isso hesitou em entrar, mas acabou por fazê-lo.
O interior, para seu
desapontamento, parecia um museu. Os móveis respiravam a antiguidade da casa e
não se surpreenderia se, de repente, se materializasse à sua frente um qualquer
personagem de finais do século XIX. Tudo o que via parecia ser tão antigo que
estaria certamente carregado com as histórias e as recordações de alguém… Só
que esse alguém não era ele!
“Well, we have to change this!” anotou ele
mentalmente. Tinha-se habituado a um requinte moderno que não casava bem
com o peso de séculos de história. Tinha noção do quanto todos aqueles objectos
deviam ser valiosos, mas estava habituado o olhar para a frente. Aquele era um
passado, sem dúvida, mas não era o seu.
Subiu lentamente as enormes e
pesadas escadas de mármore com os degraus gastos pelos passos das incontáveis
pessoas que por ali tinham passado, subindo depois outras de madeira que o
levavam ao quarto.
O quarto era enorme,
desnecessariamente enorme, com uma cama de dossel que daria facilmente para
quatro pessoas. O quarto respirava à mesma antiguidade do resto da casa.
Pousou a pequena mala de mão
que trazia num cadeirão, tirou o telemóvel de dentro do bolso do casaco e
marcou um número.
- Sr.
César, precisa de alguma coisa? – Ouviu em resposta quase de imediato de
Victor.
- Para
hoje não. Quero que comece, amanhã, a preparar um leilão de todo o recheio
desta casa. Todo o lucro deverá ser doado a uma instituição de caridade que lhe
direi depois. Mas pode começar os preparativos.
- Com
certeza. Deseja mais alguma coisa?
- Não,
é tudo. E desligou.
Depois, dirigiu-se à varanda
do quarto, abriu as portas, saiu, respirou fundo e deixou-se mergulhar na
paisagem deslumbrante carregada de um verde inebriante…
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