Sentiu-se ofuscado assim que passou
as portas do aeroporto e mergulhou na luz. Já se tinham passado
mais de trinta anos e
já nem
se
lembrava
da
luz
única
que
Lisboa
tinha. Só
então,
banhado
na
luz
e
calor
daquele
dia
de
Agosto
se
apercebeu
da
saudade
que
tinha.
Sentia-se
em
casa.
Chegara.
Dirigiu-se ao primeiro táxi da
fila, abriu a porta e sentou-se. Provavelmente muita coisa havia mudado em
Portugal, mas os taxistas nem por isso. No rádio ouvia-se fado e, se ele não
tivesse a certeza absoluta do ano que era, acharia que ainda estava no início
dos anos oitenta. A camisa aberta até à barriga, o fio de prata com um
crucifixo, a ampla pelagem hirsuta que saltava da camisa aberta… Se o homem
tivesse um bigode, que não tinha, seria o típico estereótipo.
O condutor baixou o volume do
rádio e aguardou que ele dissesse qualquer coisa, fosse o que fosse. Ele
percebeu a hesitação. Estávamos no aeroporto, e ele tanto podia ser Português
como Russo, Italiano, Dinamarquês… Ele pensou se devia arriscar o Português
para se dirigir ao taxista. Já não o falava desde que tinha partido. Tinha
feito a opção de se tentar afastar de tudo o que o agarrava aqui, e a língua
era talvez o mais significativo. Claro que mais de trinta anos sem falar uma
língua faz com que quase se tenha de a reaprender. Decidiu não arriscar.
– Sintra, please.
– Yes, sir. – Respondeu o
taxista de imediato, arrancando.
Se à saída do aeroporto não
tinha visto grandes mudanças, à excepção do próprio aeroporto, tudo o resto
parecia exactamente igual e ao mesmo tempo brutalmente diferente. Era estranho
o contraste entre a cidade que permanecia imutável a conviver lado a lado com
fileiras de prédios novos, na alta da cidade, de gosto algo duvidoso. Lisboa
esticava-se até aos seus limites e a cidade que ele deixara, ainda com quintas
e com pessoas que criavam as suas galinhas e o seu porquito na sua horta ia
desaparecendo para dar lugar à mesma modernidade padronizada da qual ele saíra.
Portugal ganhava alguma sofisticação mas ele, curiosamente, perguntava-se se
isso seria bom…
Mas depois olhou para o
taxista!
“You can take the girl out of the trailer park,
but you can’t take the trailer park out of the girl” pensou de si para si e
sorriu. A alma lusitana estaria salva enquanto espécimes destes,
genuínos, existissem.
A viagem até Sintra decorreu
num relativo silêncio entre os dois, tendo como banda sonora um interminável
encadeamento de fados enquanto percorriam estradas por entre selvas de betão
que existiam onde antes apenas havia quintas a perder de vista.
Chegados finalmente ao
destino, numa estrada em plena serra nos limites da vila, pagou, saiu e encarou
o imponente portão de bronze oxidado…
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