sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

Chuva - XXXVI

O passo seguinte seria falar com o Rafael. O Fernandes esqueceu o cansaço, ligou-lhe, combinou um encontro para dai a uma hora em Lisboa, e arrancamos.

A hora em questão passou devagar. A auto-estrada pareceu longa. Quando finalmente chegamos, vi que estávamos em casa dele. Foi a esposa dele quem veio abrir a porta. Cumprimentou o Fernandes de uma forma alegre e casual, típica de pessoas com alguma intimidade. Depois o Fernandes apresentou-me e ela ficou algo especada a olhar para mim, com um misto de sentimentos no olhar que não me deixou distinguir nenhuma em particular, mas onde predominava a admiração.

Levou-nos para a sala onde o Rafael trabalhava com um portátil em cima da mesa. Este ia para cumprimentar o Fernandes mas assim que lhe olhou para a cara perguntou de imediato “O que é que vem por ai?”

“Nem queiras saber…”

O Rafael cumprimentou-me. A esposa dele, a Raquel, salvo erro, perguntou se queríamos beber alguma coisa. O Fernandes disse que até bebia um whisky, eu aceitei uma garrafa de água com gás. Ela trouxe a garrafa, um pequeno balde de cristal com gelo, a minha água e três copos. O Rafael serviu dois copos, deu um ao Fernandes e voltou-se para mim.

“Nova mensagem?”

“Sim.”

“Posso saber qual é?

“Podes. Houve interesses velados. A descoberta escondida mantém milhões como reféns. Salva África.”

“E o que é que isto quer dizer?”

“Sabes, até aqui tenho confiado na minha interpretação das mensagens para as descodificar. A mensagem do terramoto não dizia a hora, falava de quando a lua estivesse no seu zénite. Foi ai que cheguei à hora porque o terramoto coincidiu com a lua cheia.

“Percebo.”

“Esta mensagem, como viste, fala de algo que foi descoberto mas mantido escondido, afecta milhões e ameaça África. Mas depois de muito pensar reparei na primeira frase. Houve interesses velados. Achei que era quase desnecessária. Mas quando vi bem a sigla que representava, cheguei a uma única conclusão.”

O Rafael olhou e disse sem qualquer sombra de dúvida “Alguém descobriu a cura para a Sida e escondeu a informação!”

Olhou para o Fernandes com um ar incrédulo.

“Uma descoberta destas não daria direito a um prémio Nobel? Como é que se abafa uma descoberta destas?”

O Fernandes respondeu-lhe.

“Sabes, pá, o Gabriel chamou-me a atenção para uma coisa, quando falamos à pouco. Quase toda a investigação é feita por laboratórios. E os gajos são empresas, enormes corporações, para as quais o motor é o lucro. Acaba por ter uma certa lógica esconder. Ganha-se mais em financiar investigação que não leve a lado nenhum e vender medicamentos que atenuam os sintomas durante anos, do que em arranjar uma cura que tem o potencial de erradicar a doença e estancar esse lucro. Do ponto de vista do investigador é um santo graal, mas do ponto de vista da administração é uma calamidade financeira.”

“Mas isso é genocídio premeditado, se olharmos para algumas zonas do mundo!

“Sobretudo para África” acrescentei eu.

“Mas o móbil do crime justifica.” Rematou o Fernandes.

O Rafael ficou algum tempo a digerir a informação. Depois voltou-se para mim.

“Gabriel, a outra previsão foi acerca de uma catástrofe natural. Não há ninguém a quem culpar. Aconteceu e pronto. Isto fala de um crime premeditado cometido por pessoas que nem tem escrúpulos para atingir os seus fins. Sabes o que é que isso quer dizer?”

“Sei. Esta informação sai e, embora ninguém seja acusado directamente, eu vou ter a cabeça a prémio.”

“Sem dúvida.”

Era verdade. Pura e simplesmente, um dia destes chegava a uma janela e levava um tiro. Mas depois fiquei a pensar. Por outro lado talvez não. Seria mais provável que não acontecesse nada. Se acontecesse toda a gente partiria do princípio de que era verdade e eu tinha sido simplesmente silenciado. Por outro lado, algo dito por mim agora tinha credibilidade, e mesmo sem certezas, haveria investigações.

“Ainda assim, quero que passes a informação.”

O Rafael olhou para mim. Depois olhou para a esposa que estava sentada no sofá, perto de nós. Foi interessante, a atitude dela. Limitou-se a acenar que sim com a cabeça.

O Rafael pegou de imediato no telefone e começou a falar com alguém.

Dai por vinte minutos, os canais de notícias e os programas de informação começaram a passar a mensagem. No dia a seguir tinha honras de primeira página nos jornais. Os principais canais de informação a nível global falavam da mensagem.

Tinha mandado um calhau da encosta de uma montanha e via a avalanche começar.


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