segunda-feira, 26 de fevereiro de 2024

Chuva - XLVII

 

 

Escusado será dizer que a única pessoa com quem comentei toda a conversa, inclusive a mensagem, foi o Fernandes.

“Tu disseste isso ao primeiro ministro?”

“Disse. Claro que disse.”

“Bem, ele não deve ter ficado muito satisfeito…”

“Sabes, ele estava com receio de mim, logo à partida. Estava a tentar encaixar-me na máquina para poder ter algum controlo sobre mim. Em vez disso, a conversa acabou por ser proveitoso por outros motivos.”

“Achas que eles vão conseguir evitar o atentado?”

“Se queres saber, acho que não. Aquilo que tem de ser, tem de ser. E o atentado vai acontecer. Mas acho que vão conseguir conter os estragos.”

“e porque é que achas que não vão conseguir evitá-lo?”

“as mensagens até agora referem sempre algo que vai acontecer ou já aconteceu de forma inequívoca. As remissões aconteceram a posteriori, o miúdo estava noutro lado, o terramoto era imparável, a cura para a sida estava escondida. As coisas acontecem sempre, a questão é se conseguimos conter os danos ou não.”

“Por esse lado, és capaz de ter razão. De qualquer das maneiras amanhã vamos ter a certeza, não é?”

E foi.

No dia seguinte fomos vendo os canais noticiosos internacionais. Pouco depois da hora do almoço é dada a notícia de que houve um acidente com uma plataforma petrolífera no golfo do México e que uma maré negra começava a alastrar, mas que as autoridades estavam já a tentar controlar a situação. Era elogiado o nível de resposta.

Mas foi a meio da tarde que veio a surpresa.

O Presidente dos Estados Unidos da América convoca uma conferência de imprensa. Lembras-te?

“Concidadãos Americanos, às dez e trinta e dois da manhã pela hora da costa leste, um ataque terrorista contra uma plataforma petrolífera no golfo levou a um derrame massivo de petróleo. As consequências só não foram piores devido à prontidão das equipas de salvamento e de contenção deste tipo de desastres. A prontidão da resposta só foi possível devido ao trabalho dos serviços secretos, mas também e sobretudo devido a uma previsão do Sr. Gabriel Guerra, o cidadão Português, que já tinha previsto o terramoto em Lisboa e que tinha afirmado que a indústria farmacêutica detinha uma cura para a sida que ainda não tinha sido revelada.

Ao Sr. Gabriel quero expressar os meus agradecimentos pessoais bem como a gratidão de todo o povo Americano.

Esta, como outras previsões anteriores provou estar certa, pelo que esta administração, com base na mensagem que foi revelada anteriormente, vai proceder a uma investigação sobre as empresas americanas de investigação médica e insta a que outros países, com empresas de investigação neste ramo, façam o mesmo.”

Ouvi isto e só pensei no meu amigo John Smith.

Dois dias depois recebi uma carta por mensageiro especial. Era dele, do presidente americano. Expressava a gratidão do seu país e oferecia-me uma cidadania honorária, convidando-me a visitar o seu país.

Nem preciso de te dizer que a partir dai tornou-se impossível a minha vida ser a mesma. A imprensa procurava-me insistentemente, convites para todo o tipo de actos que possas imaginar…

…começaram a oferecer-me dinheiro para aparecer em eventos, vê lá...

Recusei tudo.

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