Abri a porta da minha sala de trabalho e dou com ela sentada na minha
secretária candidamente.
“Quem é você?”
“Há quem me chame Tentação.”
Podia ser que sim, mas para mim era-o tanto como o pisa-papéis de vidro
transparente que estava em cima da minha secretária.
“Mas tenho a certeza de que esse não é o seu nome.”
“Não, não é. Chame-me Babilónia.”
Olhei para ela. Babilónia?
“A prostituta escarlate?”
“Ora, não sou escarlate, pois não?”
Realmente não era.
“Como é que entrou aqui?”
“Fui muito simpática com o vigilante. Sabia que a simpatia pode levar-nos
longe?”
Tinha de falar com o vigilante acerca de moças simpáticas. Mas suspeitava
que uma mulher como ela não precisasse de ser muito simpática.
“E o que é que faz aqui?”
“Há pessoas que estão preocupadas consigo.”
“Há?”
“Claro que há. Sabe, há quem pense que o senhor é apenas um homem, como
outro homem qualquer, com desejos, paixões… por outro lado há que tema que não
o seja…”
“Um homem como outro qualquer?”
Ela olhou languidamente para mim, fez um sorriso.”
“Um homem!”
“Não percebi.”
Claro que tinha percebido. Eis o teste. Eis a razão de ela estar ali.
Ela testava a minha mascara, a que eu tinha refinado. Sentia a repulsa por
ela e lembrava-me do que tinha sentido na outra e única vez que estive com uma
mulher.
Chamavam-lhe tentação porque ela devia ser uma mulher realmente tentadora.
Linda, sedutora, voluptuosa, a transpirar luxúria…
…só havia uma resposta lógica à razão de ela estar aqui. Seria eu a besta?
Teria eu vindo anunciar o final dos tempos? Ou seria eu um homem igual a tantos
outros, capaz de apreciar a sua beleza, passível de ser seduzido, incapaz de me
impedir de mergulhar na volúpia e na luxúria…
Ela levantou-se, aproximou-se de mim, devagar, sem tirar os olhos dos meus.
“Tem medo de mim, Gabriel?”
Naquele momento tive, sabes. Tive de parar para pensar um pouco, aproveitar
as pausas dela, aproveitar o facto de ela caminhar devagar para mim para ter
esse tempo para pensar.
O que deveria eu fazer?
Fosse o que fosse, não poderia nunca revelar-me. Não podia deixá-la
perceber que nada do que ela fazia me dizia fosse o que fosse. Era capaz de
apreciar a sua beleza estética a um nível intelectual, claro que era. Mas não
sentia desejo nem paixão. Não sentia qualquer apelo por ela. Fisiologicamente o
meu corpo respondia, mas por dentro sentia-me árido.
Ela chegou bem perto de mim, o rosto dela em frente ao meu, os seus olhos
ao nível dos meus, e fez a pergunta numa voz suave.
“És um homem, Gabriel?”
Tive de suprimir tudo o que sentia pela proximidade do seu corpo, tive de
deixar a minha mascara aparecer, olhei-a, sorri. Agarrei a sua mão até mim,
deixei-a sentir a minha reacção fisiológica.
“Que é que achas?”
Ela olhou fundo nos meus olhos tentando perceber o desejo. A minha mascara
teve de o sentir. E teve de sentir a luxúria. E tive de a agarrar e beijar.
Tive de deixar a sua língua entrar na minha boca, tive de procurar a sua.
Tive de passar as mãos pelo seu corpo e sentir a macieza da sua pele…
…tive de a envolver e apertar contra mim…
…tive de a deixar sentar-me na minha cadeira giratória enquanto se
ajoelhava no chão, fazia deslizar o fecho das minhas calças, agarrou o meu
sexo, massajou-o, envolveu com a sua boca…
…tive de vê-la despir-se à minha frente devagar e de uma forma que qualquer
homem acharia mais que provocante…
…tive de vê-la deitar-se nua na minha secretária…
…tive de me colar ao corpo dela e sentir o sabor da sua pele, deslizar pelo
seu corpo…
…tive de provar o seu sexo, sentir o sabor dela a invadir a minha língua,
fazê-la sentir prazer enquanto se contorcia na minha secretária como uma gata
com cio, levá-la e um orgasmo a seguir ao outro…
…tive de a penetrar, sentir o meu sexo no dela a deslizar, fazê-la sentir a
maneira como o meu corpo reagia…
…tive de a fazer sentir-se verdadeiramente desejada, olhá-la nos olhos
enquanto a penetrava e ouvia os seus suspiros e pequenos gritos de prazer…
…tive de sentir as hormonas a correr-me no sangue, aumentando as sensações
no meu corpo, fazendo de mim um animal que não sou…
…e quando não aguentava mais, tive de ceder, vê-la a querer a proximidade e
fingir-me com ela, deixar que o orgasmo chegasse, sentir o meu corpo a fugir ao
meu controlo.
E naquele momento ela olhava-me e eu não consegui conter um esgar de ódio,
repulsa, nojo…
…mas que acho que ela interpretou como prazer.
Fiquei ainda um pouco dentro dela, com o meu corpo exausto deitado sobre o
seu. Ao fim de não muito tempo ela beijou-me. Eu levantei-me, sai de dentro
dela e deixei-me cair na cadeira. Ela ficou mais algum tempo deitada.
Por fim levantou-se como se nada se tivesse passado, vestiu-se.
Eu fiz o mesmo.
Depois chegou ao pé de mim e beijou-me.
“Adeus, meu querido.”
Virou-me as costas e dirigiu-se para a porta. Abriu-a e voltou-se para mim.
“Sabes, se alguém me perguntasse eu teria de dizer que és verdadeiramente
um homem.”
Depois saiu.
Já eu, se alguém me perguntasse, não saberia a resposta.
Finalmente só, deixei extravasar toda a fúria, a raiva, a frustração. Tinha
de me acalmar.
Ela estivera muito perto de ver para além da minha mascara…
…mas não viu.
Sem comentários:
Enviar um comentário
O QUÊ?!?!? ESCREVE MAIS ALTO QUEU NÂO T'OUVI BEM!