Phil estava sentado a bebericar o seu Gin num luxuoso bar em Manhattan, numa cabine semiprivada quando um estranho se sentou à sua frente, sem cerimónia, sorrindo.
-Desculpe, amigo – disse com um ar que tinha tanto de surpreso como de aborrecido – mas espero companhia e há mais lugares vagos por aí.
-Lamento, mas hoje a sua companhia não vai poder vir.
Como se se tratasse de uma deixa numa peça de teatro, o seu telemóvel tocou. Ele viu quem era no visor, olhou para o estranho e atendeu.
-Sim?
-Oi, querido. Olha, desculpa mas hoje não vai dar. Tive uma rotura de um cano em casa e tenho de ir para lá, por causa dos canalizadores… Desculpa. Queria tanto ver-te…
-E eu a ti. Vai lá. Depois combinamos qualquer coisa.
-Eu prometo que vai valer a pena – disse a voz do outro lado num tom provocador.
E sem mais palavras Phil desligou a chamada e encarou o estranho.
-Sabe, Phil, nós precisávamos de ter esta conversa e, pelo que temos observado, este seria o único momento possível.
-Creio estar em desvantagem. Como disse que se chamava?
-Não disse. E isso é um detalhe inconsequente para a nossa conversa.
-E o que o leva a crer que eu queira falar consigo?
-Tenho motivos para pensar que não só falará, como até poderá vir a colaborar e, quiçá, ser visto como uma espécie de herói. Não que o mereça, para ser franco. Mas estou-me a adiantar.
Entretanto chegou um empregado que trouxe outro Gin para Phil e uma bebida para o estranho.
-Phil, lembra-se de há uns oito anos atrás, quando deixou a companhia discográfica?
Phil, não respondeu, limitando-se a olhar para o estranho. Depois levantou-se, mandou com umas notas para cima da mesa e virou-se para sair.
-Se fosse eu a si não faria isso. – Disse o estranho de repente - Sabe, basta eu mandar uma mensagem com o meu telemóvel e em minutos a sua esposa que neste momento, enquanto falamos, está num centro comercial, numa loja de roupas para crianças, ficará a saber com detalhe o que acontece quando sai cedo do trabalho às sextas-feiras… como hoje, por exemplo.
Isto parou Phil, que olhou para o estranho e voltou a sentar-se.
-Isto é alguma tentativa de extorsão?
-Não, de todo. Como lhe disse é uma conversa. Mas para esta conversa dar frutos, tem de ser uma conversa honesta. Sendo um homem inteligente, como sei que é, partirá certamente do pressuposto que há coisas que sabemos à partida, portanto tentar nega-las de alguma maneira só o fará parecer mal aos nossos olhos. E já percebeu que queremos e faremos o que for necessário para garantir a sua honestidade. Portanto tudo o que acontecer consigo a seguir a esta conversa será uma directa consequência dos seus actos, para o bem e para o mal. Estamos entendidos?
Phil anuiu.
-Pode então responder à minha pergunta?
-Sim, lembro-me perfeitamente.
-Porque é que saiu abruptamente da companhia? Segundo entendo tinha a total confiança do CEO e de certeza que este cobriria qualquer oferta que lhe fosse feita. Afinal, não teria sido útil mantê-lo por perto?
-Porque é que acha isso?
-Porque sabia, por certo, de muita coisa que se passava no topo da editora.
-Quando eu saí assinei um acordo que me proíbe de usar qualquer informação que tenha de um modo que prejudique a editora.
-Certo. Mas porquê sair?
-Se calhar precisava de novos desafios…
O estranho sorriu.
-Lembra-se do que eu disse acerca da honestidade? Como é que podemos criar uma relação de confiança se continuar a insistir em distorcer a realidade.
-Como assim?
-Vejamos: É o homem de confiança da pessoa no topo da companhia durante anos; de repente sai para uma firma onde entra directamente como sócio; Graças a isso e a ter expandido o seu círculo social, está agora casado com uma herdeira de um império financeiro de biliões. Torna-se óbvio que a sua saída só lhe trouxe sucesso. Mas ambos sabemos que o motivo pelo qual saiu não foi procurar novos desafios. Assim como ambos sabemos que a sua boa fortuna não foi totalmente fruto de trabalho árduo e alguma sorte.
Phil, engoliu em seco.
-Tentemos mais uma vez, de forma mais definitiva. Porquê sair?
Phil fez uma pausa. Podia dar dezenas de respostas e argumentar de forma plausível, capaz de convencer um júri, para todas elas. Afinal, era isso que fazia na vida. No entanto neste momento duvidava que isso lhe trouxesse alguma vantagem. Analisou bem a sua posição e, sentindo-se encurralado respondeu:
-Por causa do desaparecimento de Robert MaCallum.
-Vê? Não é mais fácil ser honesto? Continuando nesta veia de honestidade, importa-se de elaborar? Como é que as duas coisas se relacionam?
Phil ficou a olhar para o estranho. O que é que ele saberia ao certo? Supostamente ninguém a não ser ele próprio, o seu antigo patrão e o próprio Robert MaCallum poderiam saber de alguma coisa. Teria Robert deixado algo escrito que tivesse vindo a lume agora? Qual seria a probabilidade? Mas também, qual seria a probabilidade de ele estar num bar numa sexta-feira à tarde a ter esta conversa?
-Sabe das fotos? – Limitou-se a perguntar.
O estranho acenou afirmativamente com um sorriso.
-Aquilo que nós pensamos é que, quando Robert desapareceu, o seu antigo patrão percebeu que se ele de repente reaparecesse aquela reunião poderia explodir-lhe nas mãos. Afastá-lo seria uma opção. Foi o que aconteceu, não foi?
-Foi. – Confirmou Phil com um ar derrotado.
-Pronto. Viu, não foi assim tão difícil.
Phil queria relaxar mas algo lhe dizia que esta conversa ainda não tinha acabado.
-E agora é onde as suas acções terão consequências.
Phil tremeu por dentro.
-Por acaso tem conhecimento do sitio onde estão guardadas estas fotos?
-Não. – Respondeu Phil, causando um ar desapontamento no estranho, começando este a pegar no telemóvel. Acrescentou de imediato – Mas sei onde estavam há oito anos. Num cofre, no gabinete do meu antigo patrão.
O estranho sorriu.
-É justo. E diga-me, o que é expectável que esteja nesse cofre? Além destas fotos, claro…
-Dezenas de outras. De várias pessoas, a maior parte artistas ou aspirantes e em alguns casos outras agentes.
-E é prática corrente serem depois usadas contra estas pessoas, certo? – Perguntando o estranho olhando para ele como se ele fosse desprezível.
-Sim.
-Muito bem, Phil. Como lhe disse, as suas acções, daqui para a frente, ditarão consequências. Escolha-as com cuidado. Por exemplo, creio que achará que será do seu melhor interesse que esta nossa conversa nunca tenha acontecido.
Phil anuiu.
O estranho levantou-se.
-A sua conta está paga. E sua mulher estará em casa daqui a vinte minutos. Sugiro umas flores e chocolates.
E assim, o novelo desta novela se vai desenrolando.
ResponderEliminarDe que adianta alguém 'subir' na vida à custa do prejuízo alheio, se um dia um investigador experiente chega até ele e lhe descobre os podres? Tudo se descobre, nesta vida!
Boa semana, Gil. :)
Abraço.
Verdade! :)
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