sexta-feira, 11 de outubro de 2024

Renascimento (XXVI de XL)

 Cassandra esperava já no apartamento de Miranda quando esta entrou e ficou surpresa ao vê-la.

-Olá, a Patrícia não me avisou que estavas aqui, senão tinha tentado despachar-me.

-Olá, não faz mal, também não estou aqui assim há tanto tempo. A Patrícia disse-me o que foste fazer.

-Advogados e tribunais. Seria suposto ser mais simples declarar alguém como morto, quando já está desaparecido há oito anos.

-Porque é que estás a ter problemas?

-Porque aparentemente como ouve alegados avistamentos até há seis anos atrás, o ministério público está a tentar contestar. E nós estamos a tentar demonstrar que esses avistamentos nunca foram comprovados. Se calhar tenho de aguardar mais uns meses até ter isto despachado. Quando fizerem sete anos do último avistamento, já não há impedimento.

-E o resto?

-Bem, tenho tido notícias dos investigadores. Acho que há muita coisa alegada, mas não conseguiram ainda obter provas…

-Sabes que hoje em dia, num caso destes, bastaria vir a público que alguém estava a conduzir uma investigação e o próprio publico se encarregaria de os condenar.

-Verdade, mas eu pergunto-me que propósito maior serviria isso?

-Não os deixar impunes?

Miranda sorriu.

-Sabes, quando chegamos de Portugal vinha consumida com essa ideia. Devia expor tudo, deixar a companhia em ruinas, arrastá-los todos para baixo… Mas e os que não têm culpa? Os que não sabiam de nada e ficam com a vida em risco por causa das decisões estupidas de uns quantos. Eu adorava fazer isso. Mas se calhar há outras maneiras. Se calhar pode-se conseguir tornar algo mau em algo bom.

Cassandra ficou admirada. Miranda perguntou:

-Bem, mas não viste falar comigo só para saber novidades, ou foi?

-Sabes que eu quero saber sempre as novidades, mas não foi só por isso. Tenho uma novidade e tinha de te contar pessoalmente.

-Então?

-Bem, tenho-te dito que tenho falado com o Tobias quase todos os dias…

-Sim. – Respondeu Miranda com um sorriso maroto.

-Bem, também sabes que eu tenho andado a tentar convencê-lo a dedicar-se a fazer aquelas peças de artesanato a tempo inteiro, mas que ele estava na dúvida…

-Sim, já me tinhas contado. E então?

-Bem, convenci-o.

-Ai sim? Conta!

-Bem, estávamos a falar e eu perguntei-lhe se ele consideraria deixar o trabalho e dedicar-se à escultura se nos casássemos.

Miranda ficou literalmente sem palavras a olhar para Cassandra com o ar mais admirado que alguém conseguiria imaginar. Finalmente lá conseguiu juntar algumas palavras.

-Bem,… Dizer-te que estou surpreendida é pouco. E ele?

-Ele disse logo que não.

-Logo assim de caras?

-Completamente. Disse que jamais iria depender de alguém, fosse quem fosse. Tinha vivido a sua vida até ali sem depender de ninguém… Aquelas coisas que tu calculas e sabes.

-E tu?

-Perguntei-lhe se isso implicava que ele não queria casar comigo. E ele volta-se e diz “Isso é diferente, eu não quero é estar dependente de ti, só porque tens a tua fortuna. Além disso, sabes que eu jamais sairia daqui”.

-E tu?

-Comprei lá uma casa. Entretanto mostrei as coisas que trouxe e mais umas fotos de peças dele, algumas que ele ainda não tinha acabado, ao Guido,…

-Qual Guido?

-Aquele da Galeria, que se meteu contigo uma vez que fomos ver uma exposição…

-Ah! Esse Guido. – Respondeu Miranda a rir-se.

-Sim. Ele adorou as peças e algumas já foram vendidas por bons preços. Acho que ele não tem de se preocupar com picuinhices. E pronto.

-Isso que dizer o quê?

-Bem, que te quero convidar para madrinha de uma casamento que vai ser lá, para onde eu me vou mudar logo que as obras numa casa estejam concluídas.

-Vais deixar Nova-Iorque assim sem mais nem menos?

-Sim. Sabes, desde que voltámos… mesmo quando mandas buscar pão Alentejano e um pastel de nata a uma padaria portuguesa… Não tem o mesmo sabor. A comida aqui parece insalubre… Até as pessoas parecem insalubres por comparação. Pela primeira vez lá, fui feliz, verdadeiramente feliz. E acho que mereço.

-Sabes que mais? Também acho. Então e isso está para quando?

-Depende do andamento das obras. Ainda é capaz de demorar alguns meses.

Miranda abraçou a amiga com genuína felicidade. Depois só lhe disse:

-Bem, o que é um anúncio de noivado sem uma festa? Hoje vamos sair para comemorar. Patrícia, - continuou ela, virando-se para a assistente – estás convidada.

 


2 comentários:

  1. Quem conhece Portugal rende-se aos seus encantos!
    Se acontecer o encontro com alguém que nos preenche a alma e os sonhos, regressa-se e por cá se fica e vai enraizando...Ambos merecem ser felizes!
    E pronto!
    Abraço, caro escritor!

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O QUÊ?!?!? ESCREVE MAIS ALTO QUEU NÂO T'OUVI BEM!