Andreia deu consigo a deambular pela
mansão, de sala em sala.
Os convivas, aparentemente conhecidos
uns dos outros juntavam-se em pares ou em pequenos grupos de conversação, sem
que se visse nada de anormal, a não ser o facto de em cada sala haver um
pequeno bar e um barman vendado.
Cada sala tinha um ambiente
particular, diferente, pelo que era óbvio que cada um se adaptava aos seus
gostos pessoais e escolhia a sala onde se sentia melhor. Andreia havia já
passado por várias salas, uma com uma lareira acesa e um pianista que tocava,
também ele, vendado, com um ambiente calmo e acolhedor onde várias pessoas
falavam tranquilamente sentados em sofás e pufes, ou outra, extremo oposto,
onde a música de dança e as luzes reinavam e onde os corpos se entregavam à
dança, bem como algumas com ambientes intermédios, e os convivas passavam de
umas para as outras conforme lhes apetecia. Uma coisa que Andreia estranhava
era que em lado algum parecia haver casais, ao contrário de outros eventos em
que ela já tinha estado.
Cansada de andar de um lado
para o outro sem saber onde se enquadrar, até porque não conhecia ninguém e a
sua timidez impelia-a a evitar os olhares dos desconhecidos que a observavam,
subiu ao primeiro andar, ficando numa espécie de varandim que dava, de um lado,
para o hall de entrada, e do outro para a enorme sala onde tinham jantado,
sendo as escadas simétricas numa sala e na outra, duplas, uma de cada lado das
salas e a encontrarem-se ao cimo formando um circulo que era atravessado ao
meio por um corredor que parecia ter todo o comprimento da mansão, saindo para
áreas de quartos, quer para um lado, quer para o outro.
Perscrutou o hall com o olhar
em busca de César e, não tendo tido sucesso, atravessou o círculo repetindo o
gesto a partir do varandim suspenso sobre a sala, só se apercebendo depois de
quão quase impossível era o seu objectivo uma vez que todos aqueles homens, sobretudo
vistos assim de cima e vestidos de forma similar, pereciam iguais.
Resolveu então conhecer o
resto da mansão e avançou pelo corredor que dava acesso a uma das alas de
quartos. As portas pareciam todas abertas e ela entrou na primeira e
encontrou-se numa sala enorme, do comprimento, talvez, da sala onde tinha
jantado, mas mais estreita e todas as paredes estavam repletas de estantes
recheadas de livros finamente encadernados, divididos claramente por temáticas.
A sala encontrava-se vazia e apesar do tamanho era acolhedora, com um qualquer
sistema de som oculto a debitar música clássica suave e relaxante. Andou ao
longo das estantes apreciando os livros expostos, alguns deles pareciam-lhe
raros, mas não se atreveu a pegar em nenhum.
Depois de dar uma volta em
passo lento pela sala, saiu e entrou na porta directamente à sua frente. Era
claramente um quarto. A porta dava para um corredor que abria mais à frente. A
meio do corredor havia outra porta à direita. Avançou e pode verificar que a
porta dava para uma casa de banho com o chão em granito. No meio da mesma
estava uma enorme banheira redonda à qual se acedia por dois degraus. Continuou
a avançar e a área do quarto abriu-se diante dela com todos os pormenores
ofuscados pela visão de um casal, ela nua, deitada de costas na cama e
envergando apenas a sua máscara sob a qual se adivinhava uma expressão do mais
puro deleite e ele, de pé, penetrando-a com suavidade e sem pressas,
apreciando-se ambos de uma forma nada animalesca, antes elevada, deixando
Andreia sem saber o que fazer e a sentir-se mal por invadir aquele espaço,
imóvel como uma estátua, mas sem conseguir despregar os olhos daquele quadro
onde aquele casal parecia alheio a tudo, ou quase, porque ela, talvez
sentindo-se observada, vira a cabeça e olha-a nos olhos, profundamente, com um
sorriso que quase podia ser considerado um convite, se não o era mesmo. Andreia
sorriu de volta, desprendeu o olhar a saiu do quarto, deixando-os entregues um
ao outro, voltando ao corredor principal. Só então se deu conta do quanto o seu
coração estava acelerado, parecendo que até lhe faltava o ar.
Continuou a percorrer o
corredor e entrou no quarto a seguir, que parecia em tudo simétrico ao
anterior, pelo menos na entrada. Esperava que estivesse vazio, mas percebeu
rapidamente que não estava ao ouvir pequenos gemidos abafados. Encostou-se à
parede da casa de banho, para se encobrir com a sombra e deu graças pela
alcatifa que abafava o barulho dos sapatos. Foi-se aproximando devagar da
esquina, deixando o quarto abrir-se diante de si e viu que a cama estava vazia.
Sentiu um choque quando a sua vista abarcou a parede distante e viu que um
homem, de pé, curvado para a frente e apoiado à mesma era a fonte dos ruídos
abafados por força da penetração forte e de ritmo animalesco de que era vitima
por um outro que estava também de pé atrás de si e o agarrava pela cintura,
sendo que Andreia não conseguia perceber se os gemidos eram de prazer, dor, ou
um misto de ambos. Apesar do choque, protegida como estava pelas sombras e
confiante de não ter sido notada, deixou-se estar a observa-los, sentindo uma
estranha repulsa, muito maior que a que tinha tido ao ver as duas mulheres a
amarem-se em cima da mesa de jade, mas ao mesmo tempo uma excitação que parecia
vir de algum sitio desconhecido de dentro dela e que a fazia ter alguma espécie
de…
…Prazer?!
Ficou a vê-los e viu o orgasmo
que o que estava por trás teve, e sentiu-o em alguma estranha medida, vendo-o
depois quase colapsar sobre as costas do outro, erguendo-se a seguir e tirando
o preservativo que lançou para um recipiente ali perto enquanto o outro se
voltava e se abraçava a ele, dando-lhe um beijo violento encostando-se em
seguida à parede enquanto o primeiro se ajoelhava, lhe agarrava o sexo e o
começava a chupar com o claro intuito de provocar um orgasmo.
Estando agora um deles de
frente para si, Andreia sentiu receio de ser descoberta e recuou devagar,
voltando para o corredor principal. Ficou a pensar se quereria continuar a
explorar a casa, perguntando-se o que iria encontrar mais. Estava nesta
indecisão quando uma mulher aparentemente jovem deslizou pelo corredor com um
andar seguro, quase felino, na sua direcção, a olhou e sorriu, entrando na
porta de onde ela tinha saído e deixando-a aberta. A curiosidade falou mais
alto e Andreia não se conteve, virou-se, vendo-a deslizar ao longo do corredor
do quarto e, logo que ela saiu da sua vista, seguiu-a e pode observar como ela,
com toda a calma do mundo, se sentou na cama a observar os dois homens,
deixando-se ficar assim por algum tempo. Depois pôs-se mais confortável e
começou a tocar-se. O que estava de pé olhou-a e sorriu. O outro nem pareceu
dar pela presença dela.
Voltou a sair do quarto e
resolveu que não queria ver mais. Embora a sua curiosidade continuasse ao
rubro, tinha medo do que mais poderia encontrar. Voltou a percorrer o corredor
e desceu as escadas para o lado do salão onde tinha jantado, passando daí para
uma sala contígua onde algumas dezenas de corpos se abandonavam ao ritmo forte
da música de dança por entre luzes multicolores e flashes.
Atravessou a sala tentando
evitar a pequena multidão e saiu para outra sala mais calma onde se ouvia a
mesma música mas onde o ambiente era mais “lounge”. A meio da sala estava um
palco circular elevado com cerca de quatro metros de diâmetro e um varão, que a
fez, imediatamente, pensar na Céu.
Sentou-se num canto,
observando tudo à sua volta e os seus pés agradeceram pois embora já estivessem
habituados a saltos altos, estes eram-no mesmo muito. Dali foi vendo o quanto a
atmosfera ia mudando, os gestos no interior dos pequenos grupos iam ficando
mais soltos, os olhares mais sedutores. Formavam-se casais, trios, as caricias
iam ficando mais incontidas. Havia grupos que abandonavam a sala, sem dúvida à
procura de recato, talvez num dos quartos do primeiro andar, mas muitos iam-se
tornando mais afoitos por ali mesmo e a atmosfera parecia estar a carregar de
electricidade. Estava perdida nos seus pensamentos e observações quando foi
interrompida:
- Não és a rapariga que veio
com o César?
Olhou para a interlocutora.
Conseguiu reconhecer imediatamente Julia, apesar da máscara. Se ela tinha
parecido magnífica na penthouse de César, aqui parecia divina. Usava um vestido
completamente rendado e apenas opaco em sítios estratégicos e que era pouco
mais do que uma saia comprida de onde saía uma tira de tecido que subia dando a
volta ao pescoço e descendo novamente e apenas uma tira muito estreita do mesmo
material a atravessar as suas costas à altura dos seios, segurava todo o
conjunto no lugar, deixando, no entanto, o seu corpo imaculado quase todo
visível e pela frente um decote largo e profundo, até à cintura.
Claro que és. Vi-vos chegar no
brinquedo novo dele. Conhecemo-nos em casa dele, mas, não só não fomos
formalmente apresentadas, como acredito que não tenhas ficado com boa impressão
de mim… Chamo-me Julia.
- Eu sou Andreia – respondeu.
- Posso…? – Perguntou Julia
apontando para o sofá onde Andreia estava sentada.
- Claro. – Respondeu Andreia
educadamente, embora pouco à vontade com a presença daquela mulher, não só pelo
que César tinha dito “(…) se o diabo fosse uma mulher, seria a personificação
perfeita(…)” –, mas também pelo facto de ela estar a concentrar as atenções
naquele sofá fazendo-a notada.
Julia ia para se sentar e
pousar o seu copo de cocktail na pequena mesa em frente ao sofá quando
perguntou a Andreia.
- Não estás a beber nada?
- Não…
- Não queres nada? Eu vou
buscar. Qual é o teu veneno?
- Água. Não gosto de álcool.
- Caramba, isto é uma festa.
Mesmo sem álcool, pelo menos algo mais festivo. Que tal um “Virgin Marguerita”?
É muito saboroso e não tem álcool…
- Não quero dar trabalho…
- Não sou eu quem o vai fazer e
quem o fizer é pago para isso, por isso…
Andreia assentiu aceitando
apenas porque não sabia como dizer que não, o que aparentemente satisfez Julia
e fez com que esta atravessasse a sala com todo o charme, continuando a atrair
a maior parte das atenções.
Voltou daí a pouco com um novo
copo para si própria, de uma bebida azul, e o de Andreia, amarela esverdeada.
Pousou os copos na mesinha.
- Alguma vez provaste um
“Virgin Marguerita”? Andreia acenou negativamente.
- É uma espécie de Marguerita
sem álcool, daí ser “virgin”. Leva Limeade, sumo de laranja, limão, lima,
açúcar e gelo. Assenta-te bem… – disse Julia com um sorriso. Andreia ignorou o
remoque.
- E o teu?
- O meu tem álcool, acredita.
Chama-se “Blue Orgasm”,… – fez um sorriso maroto – …e sabe como um.
- O que é que leva?
- Rum de coco, Sour Mix e Blue
Coraçau.
Andreia provou o seu cocktail
e, simplesmente, adorou o sabor intenso. “Ainda bem que ela me convenceu”
pensou de si para si.
- Então o César enleou-te…
Letalmente directa, com um sorriso.
- Não faças esse ar. Podíamos
formar um clube e olha que não era fácil encontrarmos um local para nos
reunirmos. Ele disse-te quem eu era?
- Só o nome…
- Só?! E não ficaste curiosa?
- Francamente, não muito…
- Pois eu fiquei. És
Portuguense? Portugana?
- …Portuguesa. Sim sou.
- Onde é que isso fica?
Andreia ficou levemente
irritada com a pergunta.
- Ao lado de Espanha.
- Mas aí não é a França?
- É, mas do lado oposto é
Portugal.
- A sério? Deve ser um sítio
pequeno!
- É.
- Não fiques zangada. Afinal,
eu não tenho de saber onde é. Se quiser saber, meto-me num avião e vou até lá…
“Dispensamos…” pensou Andreia.
- E como é que conheceste o
César?
- Fui convocada.
- Convocada?! – Mesmo atras da
máscara todo o ar de Julia era de espanto – Pelos vistos é um país de costumes
estranhos…
“Diz o roto ao nu…” pensou
Andreia enquanto acabava de beber o seu cocktail que era, sem dúvida, delicioso
e olhava em volta apercebendo-se que a temperatura subia ainda mais na sala com
as roupas a começarem a ficar espalhadas pelo chão e as caricias e contactos a
ficarem mais íntimos e a serem feitos quase independentemente do sexo. A sua
expressão deve ter sido óbvia a Julia que continuou:
- Pois, isto dito aqui… Mas nós
não somos a regra. Somos a excepção entre as excepções. Voltando ao César:
Convocada?
- Sim. – Limitou-se Andreia a
responder enquanto sentia uma espécie de formigueiro ligeiro, estranho, como as
“borboletas” que se sentem no estomago, mas nas pernas, e ao mesmo tempo
relaxada e em paz, verdadeiramente feliz, verdadeiramente maravilhada com a
perfeição do copo que tinha na mão e observou-o pela primeira vez, belo, e como
era suave e lisa a sua textura contra a sua pele e olhou em frente ficando
absolutamente envolvida no liquido azul do copo de Julia e sentiu-se ainda mais
feliz e olhou para Julia e percebeu o quanto a sua voz era melodiosa e sedutora
e suave acima daquela música inspiradora que lhe enchia a alma, Julia,
maravilhosa, deslumbrante, divina, com os seus longos e definidos canudos
doirados que lhe caiam como uma cascata de ouro da cabeça a ondularem
suavemente a cada movimento seu e apetecia-lhe tocar-lhe com a suavidade com
que a sua própria roupa tocava na sua pele, a aconchegava e percebeu o quão
magnifico era o sitio onde estava, deslumbrante e a beleza dos corpos que,
soltos, se começavam a amar em volta dela e percebeu que estava envolvida
naquela maravilha e olhou para o varão, lembrando-se de Céu, percebendo o
quanto a admirava, invejava e levantou-se e caminhou serenamente para ele,
subiu ao palco, agarrou-o, sentiu-o na sua mão, deixou-se invadir pela música,
abandonou-se a ela e começou a dançar, a deixar sair de dentro de si todas
aquelas coreografias treinadas e ensinadas para lhe dar a confiança que ela
finalmente sentia e pouco a pouco percebeu que a sala parava e se dirigia a si,
a admirava, sentiu-se, pela primeira vez na sua vida, sublime, desejada por
todos aqueles homens e mulheres, desejada por Julia que a observava com um ar de
espanto enquanto a sua roupa saía de cima de si sem esforço, de forma fluida,
escorregando-lhe na pele, causando uma excitação como nunca sentira, e o desejo
deles enleva-a, consome-a, aquece-a e fá-la desejá-los a todos, belos todos e
estende a mão sendo tocada por alguém o que lhe provoca a maior excitação que
já sentira, quere-o, embora não saiba quem é, quer alguém e entrega-se aos que
a vêem, finalmente, e é recebida com agrado, com carinho, desejo, tesão, sente
mãos no seu corpo, lábios, línguas e no meio de tudo aquilo, ele, finalmente
ele, César, arrebata-a de entre a multidão, toca-lhe, apanha as peças de roupa
espalhadas no chão e leva-a, assim, nua, em direcção à rua, cobre-a com aquele
tecido que tão bem lhe sabe contra a pele, saem da mansão, entram no carro e
ele arranca gloriosamente rápido em direcção à lua cheia que faz brilhar a sua
luz branca e fria sobre o deserto fazendo as sombras ganhar contornos
geométricos…
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