segunda-feira, 15 de abril de 2024

Conscientização - XLIII

 Ela abriu a porta do quarto, agarrou o rapaz pelo colarinho, puxou-o para si, beijou-o, riu-se, empurrou-o para dentro do quarto e nem acendeu a luz, arrastou-o para a cama, atirou-o para lá, riu-se novamente, olhou para ele com ar de mulher fatal, que era e sabia sê-lo, começou a desapertar a camisa devagar fazendo o rapaz engolir em seco com a antecipação do que viria, enlevado pelo sorriso predador, mesmerizado e ela abre a camisa e desfralda-a deixando-o ver o corpo perfeito e a pele suave que o faz salivar…

Num canto escuro do quarto uma faísca risca o ar acompanhada pelo som de um isqueiro que se acende e uma nuvem de fumo, visível nos feixes na luz recortada que entra pelo estore, invade o ar com o cheiro doce e espesso da erva.

Ela levanta-se irritada.

- Ainda a fumar os teus cigarrinhos, César?

- Tal como tu continuas a comer rapazes mais novos. Há hábitos que são difíceis de perder.

Ela acende a luz, revelando-o, olha glacialmente para o rapaz que assiste mudo deitado na cama e diz – Sai. – sem qualquer hipótese sequer de argumentar. Ele levanta-se e sai, confuso, sob os olhares de ambos, o de Julia irritado e o de César quase divertido.

- Desculpa ter-te interrompido. Não é que não seja um bom espectáculo ver-te com outro gajo, mas ao fim de algumas vezes acaba por se tornar repetitivo.

- Então lá deste comigo…

- Não é como se andasses a tentar passar despercebida, não é verdade?

- Pois… Na verdade estava à tua espera, mais dia, menos dia. Admito que não esperava que fosse tão cedo, mas enfim, às vezes a vida surpreende-nos. Mas a que é que devo a honra?

- Um simples pedido. – Olhou-a nos olhos, a sua expressão implacável – Deixa-me em paz, de uma vez por todas. A mim e aos que me rodeiam. Pára.

- Não.

- Não?! Mas porquê?

- Porque tu és meu. Porque somos iguais. Porque eu quero-te para mim.

- E desde quando é que eu sou uma comodidade tua? Quem é que te deu o direito a essa pretensão? Mete na tua cabeça: acabou.

- Ninguém me despreza, ouviste? Ninguém, muito menos um tipo qualquer que saiu dum buraco destes…

- Ah! É esse o teu problema? Então dou-te um conselho: engole o teu orgulho e segue em frente. E isto é um aviso.

- Tu… Tu atreves-te a ameaçar-me? A mim?

- Só te digo que se não paras de uma vez por todas eu faço-te engolir o orgulho. Não te esqueças de uma coisa: eu sou um grande filho da puta quando quero, e se há uma pessoa que sabe o quanto eu o consigo ser és tu. Pensa nisso.

- Mas quem és tu para fazer uma ameaça dessas? De há três anos para cá não passas de um triste a viver de rendimentos…

César parou a olhar para ela e sorriu. Agarrou num portátil que estava ao pé de si, abriu-o e passou-lho.

Ela olhou irada e desconfiada para ele. Agarrou o portátil, sentou-se e começou a analisar gráficos, folhas de cálculo, projecções de crescimento de centenas de empresas em quase todas as áreas, começou a ter noção do que César estava a fazer, percebeu as ramificações. Olhou para ele, incrédula.

- Se não parares faço-te ficar sem absolutamente nada num piscar de olhos.

Ela olhou para ele com medo, percebendo que o que ele dizia era verdade. Ele estava em posição de poder fazer isso. Como é que era possível que ele tivesse conseguido fazer isto sem ninguém se aperceber?

Ele tirou-lhe o portátil das mãos, fechou-o, arrumou-o numa mala, voltou-se para ela disse simplesmente:

- Considero este assunto definitivamente encerrado. A um sussurro teu, estalo os dedos! Estamos entendidos?

O ódio incendiou-lhe os olhos a medida que se apercebia da sua impotência. Limitou-se a assentir. Ele virou-lhe as costas e saiu.

Isto não ficaria assim, não podia. Ela não podia estar tão vulnerável. Nem tão humilhada.


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