Passaram mais duas semanas em L.A.,
recheadas de reuniões com conselhos de administração
e eventos. Em todos
eles foi Andreia quem teve o papel
principal, apesar
de sempre instruída por César.
Por fim, voltaram a Portugal,
onde chegaram a uma hora já tardia, tendo Andreia apanhado um táxi directamente
para Sintra e César outro para ir ter com Céu.
Chegou pouco depois da sua
actuação, cumprimentou o staff, que entretanto se tornara já conhecido, e
alguns clientes regulares que o saudaram pelo seu regresso, e dirigiu-se ao
camarim.
Bateu à porta.
- Entre. – Ouviu do outro lado,
abriu a porta e entrou encontrando céu vestida com um robe comprido e a
desmaquilhar-se em frente ao espelho. Viu-o e deixou-se ficar com uma
indiferença irritante.
- Ah! És tu. – Limitou-se a
dizer enquanto continuava.
- Sim, sou eu. – Respondeu
César, um pouco admirado com a reacção dela – Ficaste exultante por me ver,
pelos vistos.
- É assim tão óbvio?
- Então não é?
Pois… acontece. Se não te
importas, deixas-me acabar de vestir.
César olhou-a, sentindo-se não
só baralhado, mas também um pouco irritado.
- Ok. Espero-te lá fora para
irmos para Sintra.
- Tenho as minhas coisas em
casa. Não estava propriamente à tua espera.
- Desculpa se te surpreendi.
Mas vamos para Sintra na mesma. Amanhã mando buscar as tuas coisas. Vamos no
teu carro. Eu vim directo do aeroporto para aqui.
- E a Andreia?
- Já foi, de táxi.
- Pronto. Então espera-me que
já vamos.
César saiu, dirigiu-se ao bar,
ficando a ruminar naquela calorosa recepção, pediu uma bebida e deixou-se
ficar. Daí a pouco apareceu Céu, já vestida.
- Vamos?
César acabou de beber de um
trago e seguiram.
Foram o caminho todo em
silêncio até entrarem na A5. Cesar tirou um dos seus cigarros de erva da
cigarreira de prata, bateu-o e acendeu-o. Deu algumas passas longas e passou-o
a Céu, que deu uma passa e lho devolveu.
- Posso saber o que é que se
passa? – Perguntou finalmente César.
- Não se passa nada. Aliás,
aparentemente mesmo nada, não é?
- Mas de que estás tu a falar?
Ela calou-se.
- Céu, não sei o que é que se
passou, mas gostava de saber.
- Precisas mesmo que eu te
diga?
- Aparentemente…
- Julgava-te mais inteligente.
- Pois, mas daí até ler
pensamentos vai um passo muito grande.
Céu voltou a calar-se. César
recostou-se no banco. Não valia a pena prosseguir uma discussão que não levaria
a lado nenhum. Continuou a fumar. Ofereceu o cigarro a Céu, mas ela recusou. Ao
fim de alguns quilómetros ela disse finalmente:
- Quem é a Julia?
César ficou perplexo com a
pergunta.
- O quê?
- Sim, eu sei da Julia. Tive
uma longa conversa com ela. Foi educativa.
- Foi?
- Foi. Disse-me muito bem quem
é o Sr. César Caetano. Como é que levas a tua vida, o que fazes realmente… As
vidas que já arruinaste, aquilo que já destruíste em nome de mais um bocado de
lucro fácil. A pessoa que és. Negas?
- Não. – Respondeu César,
olhando para ela calmamente. – Não o nego. Sei muito bem o que sou e quem sou.
- Como é que consegues dormir?
Como é que podes viver em tanta mentira e engano. – César não sabia o que
dizer. As palavras de Céu eram como pedras atiradas contra a sua carne, e,
embora não o demonstrasse por fora, por dentro tremia. Pela primeira vez alguém
o confrontava com os seus próprios temores, e quem o fazia era Céu.
- Tens razão.
Céu reprimia as lagrimas,
evitando olhá-lo e fixando os olhos na estrada.
- Aquelas histórias que me
contaste, na herdade… Alguma coisa daquilo era verdade?
César não respondeu.
- Eu confiei em ti, porra! –
Acabou por gritar – Eu, que nunca confiei em ninguém, confiei em ti. E olha só
o que ganhei…
César queria estender a mão em
direcção a ela, mas sabia que não seria prudente fazê-lo.
- E ainda por cima tive de
saber quem tu és pela tua mulher…
- Perdão?
- Sim, César. Eu vi a certidão
de casamento.
César olhou para ela e
percebeu que para lá da confusão havia ódio. Mas não um ódio normal. E algo
dentro dele sorriu.
- Por acaso também te mostrou a
de divórcio?
Ela levou uns minutos a
processar aquela informação. Finalmente olhou para ele com o olhar cheio de
interrogações.
- É verdade. Ela foi minha
mulher. Divorciamo-nos há mais de três anos. Mas já percebi que tens, neste
momento alguma dificuldade em acreditar em mim. Acredita, não te tiro qualquer
razão, mas quero que acredites numa coisa. Até agora posso ter pecado por
omissão, mas não te menti. Nunca te menti, nem sequer quando seria fácil
fazê-lo. Quando chegarmos mostro-te a certidão de divórcio.
Ela respirou fundo, voltou a
olhar para a estrada e deixou-se ficar em silêncio, acalmando-se.
- O que é que se passou com a
Andreia?
- Muita coisa.
- Queres dizer-me a verdade?
Queres falar-me daquele baile de máscaras onde estiveste com ela?
- Queres saber a verdade? Eu
digo-te. Fui lá porque, no dia em que cheguei a Julia estava no meu apartamento
e, além de ter feito uma cena triste, disse-me que alguém que eu precisava de
contactar estaria lá. Era uma oportunidade de o apanhar e desbloquear um
negócio. Fomos os dois, separámo-nos depois do jantar, eu encontrei o Levy, a
pessoa que precisava encontrar, e chegamos a um acordo, a Andreia encontrou a
Julia que a drogou com extasy e a levou a pôr em pratica os teus ensinamentos
de dança, com mais êxito que seria de esperar, diga-se. Queres saber mais?
- Quero saber tudo.
Tirei-a do meio de uma mini
multidão que se atirava a ela, enfiei-a dentro do carro e viemos para casa.
- E foi só isso?
- Não. A meio do caminho ela
estava inquieta e dei-lhe um cigarro de erva para a acalmar. Quando chegamos a
minha casa falamos. Ela implorou-me para fazer amor com ela…
- Porquê?
- Reacção às drogas, sobretudo,
mas não só. Ela precisava mesmo de alguém. Sentia-se incompleta.
- E tu?
- Recusei. Disse-lhe que ela
estava drogada e que não havia absolutamente nada entre nós. Ela disse que era
precisamente por isso. Que só queria sentir, uma vez que fosse na vida, o toque
de alguém que lhe desse algum valor.
- E…?
- E acabei por fazer amor com
ela.
Céu estava abismada. Com a
situação e com a absoluta sinceridade.
- E como é que ela está?
Acho que melhor que nunca.
Vais ver, acho que se nota a diferença.
- E como é que ela está em
relação a ti.
- Normal. Acho que ela se
convenceu de que não aconteceu nada. Mas ela mudou bastante, está assertiva,
segura. Cuida-te, senão qualquer dia tens concorrência à altura…
Ele atrevia-se a brincar com
aquela situação?
- Mas tu achas isso normal?
- Tanto quanto tu.
Calou-a. Na verdade, que
direito tinha ela de o criticar naquele assunto especifico?
- Quando chegarmos mostro-te o
raio da certidão de divórcio. Não disseram nem mais uma palavra durante o resto
do caminho.
Chegados a casa, César foi
buscar a certidão, mostrou-a a Céu, e depois antes de irem cada um para seu
quarto, César perguntou:
- Significo assim tanto para
ti?
E seguiu, fechando a porta
atras de si.
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