Ao fim de algumas semanas Marie estava já habituada à nova rotina. Tinha mergulhado no seu trabalho de cabeça, tentando aprender tudo o que era necessário o mais rapidamente possível e, graças a manter uma atitude humilde perante os colegas, todos gostavam de trabalhar com ela, embora a achassem extremamente solitária.
Ninguém na empresa sabia que ela conhecia o patrão, o que facilitou a sua integração. Não demorou muito até que começasse a ser convidada pelos colegas para se juntar ao grupo e descontrair um pouco nas sextas à tarde, algo que era quase uma tradição do escritório, mas recusava sempre.
O dinheiro que ganhava chegava para pagar as contas e pôr comida na mesa, mas não sobrava nada para grandes luxos. Assim, a sua vida resumia-se agora à rotina comum a tanta gente, e a sua vida social resumia-se a saídas com Lisa e Fernando, que pelo menos uma vez por semana insistiam com ela para almoçar ou jantar com eles.
Ao fim de semana tinha sempre pelo menos um dos filhos com ela, mais frequentemente Patrícia, que estava no fim do seu curso e com mais tempo disponível que Tiago, completamente embrenhado na dificuldade do curso de engenharia que escolhera.
Os irmãos viram como a mãe queria levar a vida para a frente e os passos que dava. Ficaram orgulhosos dela por arranjar um emprego e tentar manter a casa onde tinham nascido. Tiago, cada vez que vinha a casa, tratava do carro do pai, tirava-o da garagem e não raras vezes davam algum passeio para o carro andar e não se degradar.
Já Marie sentia que o trabalho lhe tinha dado um propósito quando não havia nenhum, e era este o seu único foco. Claro que todos os dias, sobretudo nos momentos de solidão, os seus pensamentos iam sempre para Alex, e não eram poucas as vezes que chorava à noite pela vida que tinha destruído com a sua própria estupidez, mas fazia o que podia fazer e apenas podia esperar.
Quando os filhos voltaram dos dias que passaram com ele, tentou de todas as formas saber alguma coisa dele, mas o mais que conseguiu foi um “Ele está bem, mãe”. Nada mais. Compreendia os filhos, mas não deixava de ficar triste por não conseguir saber mais.
Teria ele seguido com a sua vida? Teria ele uma nova namorada? Será que ele alguma vez tencionava voltar? Será que alguma vez ele a perdoaria, mesmo que não voltassem a ter uma relação. Todas estas incertezas a faziam muitas vezes vacilar, pensar se valeria a pena tentar manter tudo. Talvez fosse mais fácil seguir em frente, procurar refazer a sua vida e tentar deixar os seus erros para trás, mas depois, bastava-lhe pensar em Alex, e sabia que não podia desistir, pelo menos até ter a certeza de que ele tinha desistido. Talvez por isso quisesse tanto que os filhos lhe dissessem algo. Ao fim ao cabo, trabalhava para um objetivo que não sabia se conseguiria concretizar e sem saber se ainda valia a pena lutar.
Estava sentada na sua secretária completamente absorta em organizar os papeis que tinha à sua frente quando ouvir chamar o seu nome:
“Marie”
Olhou para cima e ficou pálida de imediato.
“Guilherme! Olá.” Respondeu embaraçada.
“Nunca pensei que veres-me provocasse essa reação.” Disse-lhe Guilherme com um sorriso “Nunca te tinha visto aqui. Trabalhas aqui agora?”
“Sim desde há algumas semanas. E tu, o que fazes por aqui?”
“Bem, tenho negócios com o Fernando e costumo reunir-me com ele aqui ou na minha empresa. As ultimas reuniões tem sido lá, mas hoje foi aqui.”
Marie sorriu.
“Pronto, está explicado o que estamos aqui a fazer.”
Guilherme apenas sorriu e ficou a olhar para ela intensamente durante algum tempo. Marie começou a ficar algo desconfortável e, como que notando isso, Guilherme continuou:
“Sei o que se passou.” Disse apenas, sendo discreto. Marie olhou para ele e simplesmente encolheu os ombros em resposta.
“Gostava de beber um café contigo e falarmos, se quiseres.”
“Porquê?”
“Porque desde que soube que me sinto algo culpado pelo que aconteceu.”
“Não tens culpa de nada. Foste tu, por acaso, por sorte, por destino… seja o que for que lhe quiserem chamar, mas podia ter sido outro qualquer…”
“Mas isso não me deixa mais descansado. Que dizes? Um café?”
“É melhor não…” respondeu Marie.
Guilherme sorriu e na sua voz mais calma e controlada disse-lhe:
“Vá lá, Marie. É só um café e dois dedos de conversa. Não te estou a convidar para jantar ou para sairmos. Um café?”
Marie pensou um pouco. Que mal faria um café? Ao fim ao cabo, embora Guilherme não tivesse levado com estilhaços quando a situação rebentou, não deixava de ser uma parte integrante de tudo.
“Ok. Um café”
Combinaram encontrar-se depois de Marie sair do trabalho e Guilherme, satisfeito, seguiu para o escritório de Fernando. À saída passou pela secretária dela e disse discretamente “Até logo” piscando-lhe o olho.
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