Tiago estava completamente perdido dentro da sua mente, tentando encontrar alguma ordem no caos que reinava nos seus pensamentos. Foi a voz de Lisa que o trouxe de volta ao sitio onde estava.
“Eu sei que se calhar é estranho, mas gostava de te dizer algumas coisas, se quiseres ouvir.”
Tiago olhou para ela.
“E o que é que tens para me dizer que eu queira ouvir?”
“Uma perspectiva.”
Tiago olhou para ela, inquiridor. Ela continuou.
“Como percebeste fui apanhada no meio desta situação por pura sorte.”
“Sorte?”
“Sim, e já te vou explicar porquê.” Disse ela com um sorriso doce “A noite com o teu pai foi estranha. Comecei a desconfiar de algo no carro mas só aqui é que tive a certeza de que ele não sabia de nada. E depois, tudo o que se passou foi no mínimo estranho e eu não percebi bem. Só ontem à noite, aqui em tua casa, sentados na mesa da cozinha é que eu percebi, não só o que se tinha passado, mas tudo o que se passava à minha volta e eu não via, simplesmente porque não via o mundo por essa perspectiva.”
Tiago parecia ainda mais confuso.
“O meu marido esteve aqui connosco ontem, até a Patrícia chegar. E foi quando a tua mãe finalmente me disse o que se tinha passado. Mas foi o meu marido que nos ofereceu uma perspectiva que nos abriu os olhos.”
Tiago continuava lentamente a beber o seu whisky, mas agora com um ar curioso e extremamente atento.
“Sabes, esta espécie de clube não oficial conta com uns quarenta casais. Quase todos os nossos maridos são empreendedores, têm cargos elevados em empresas. Podes dizer que são pessoas influentes e abastadas. A maior parte de nós não trabalha sequer, embora algumas o façam. Outras envolvem-se em voluntariados para ocupar o tempo e outras simplesmente não fazem nada. A tua mãe… Bem, claramente não ia aos nossos encontros, porque são para casais e ainda que ela alguma vez quisesse vir com outro homem, isso nunca seria permitido. Mas era uma espécie de membro não oficial. É uma das amigas do grupo e nos discutíamos as coisas abertamente. E verdade é que brincávamos com ela e a chamávamos de “a virgem do grupo” mas na pura brincadeira. No fundo todas nos invejávamos a relação e a cumplicidade que ela tinha com o teu pai. Bem, também olhávamos para o teu pai. Acho que todo este ambiente poderá ter levado a tua mãe a imaginar o que seria estar com outro homem sem culpa. E aquilo que fazemos era o ideal. Não há qualquer envolvimento emocional. O parceiro, homem e mulher são escolhidos à sorte. Se não há sentimentos envolvidos, então é só mesmo o acto por diversão. De certeza que compreendes isso, não?”
“Claro que percebo.” Disse Tiago “E para ser sincero, não me choca. Se todos os que lá estão consentem no que se passa, o que outros pensam ou não é com eles.”
“Exacto. Além disso a tua mãe ouvia as histórias que contávamos de chegarmos a casa depois de uma noite de sexo com uma energia diferente, porque, quer queiramos quer não, é diferente, o facto de estares a conhecer e a dar-te a conhecer a alguém intimamente pela primeira vez, e o reencontro com os nossos maridos, as pessoas que realmente queremos e amamos e como isso era absolutamente explosivo para ambos e o quanto fazer amor a seguir era divinal e nos conectava intimamente. Portanto podes calcular que a tua mãe ouvia isto e, por muito boa que fosse a sua vida no quarto com o teu pai, não havia esta energia. E acho que a tua mãe se convenceu que se fizesse isto, uma única vez, porque mesmo quando ela nos disse que finalmente iria a uma reunião, disse-nos logo que seria uma vez portanto a sortuda que tivesse o seu marido, que aproveitasse, mas nesta única vez ela queria trazer essa energia para a relação e dar-se depois de uma maneira intima e maravilhosa ao parceiro. E se me perguntasses ontem, eu diria a pés juntos que isto tem toda a lógica e dai não conseguir perceber muito bem a reacção do teu pai, ou por outra, perceber, mas achar a reacção exagerada.”
“Então e se eu te perguntar hoje?”
“Se me perguntares hoje… Eu digo-te que após a conversa que tivemos aqui ontem e que acabou por ter um desfecho em casa, não vou voltar ao clube. Percebi que, apesar de o meu marido participar voluntariamente, toda essa questão da energia era algo que eu sentia, mas ele não. Pelo contrário, magoava-o. Que ele apenas me acompanhava porque tinha medo que se isto não acontecesse eu acabaria por o trair um dia. Porque tem noção do tempo que o trabalho lhe tira e se sente culpado por não me dar esse tempo e atenção, e tem medo que alguém tome esse lugar. E eu nunca me tinha passado isso pela cabeça. Que ele pensasse dessa maneira.”
Tiago olhava para ela, avaliando as suas palavras.
“Não estou a querer desculpar os actos da tua mãe. São o que são… Mas queria que tu percebesses que o maior erro dela não foi a mentira, a traição ou o desrespeito, foi antes a arrogância de pensar que sabia o que era melhor para ambos e agir unilateralmente. Mas que no fundo a intenção não era magoar o teu pai, antes pelo contrário era oferecer-lhe algo mais dela própria.”
Tiago olhou para ela durante um longo tempo. Depois disse simplesmente:
“Obrigado”
Lisa acenou em assentimento, percebendo que ele entendera o que ela dissera e esperou que ele pelo menos percebesse que a sua mãe não era uma má pessoa ou maquiavélica, apenas uma pessoa que fez as escolhas erradas por motivos certos.
“Vou só espreitar a tua irmã e a tua mãe e vou indo…”
“Claro vai…”
Lisa subiu as escadas e espreito o quarto. Patrícia abraçava a mãe que parecia calma de olhos fechados. Desceu as escadas, Tiago levou-a à porta e partiu.
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