“Bom dia.” Soou a voz de Lisa assim que Marie atendeu.
“Bom dia, Lisa.”
“Olha, estou a ligar porque passo aí daqui a uma hora para irmos almoçar.”
“Lisa, eu não estou bem e não estou com disposição…” Lisa interrompeu-a de repente.
“Nem penses. Há uma semana que não sais de casa e há dois dias que estás aí sozinha sem ninguém. Já tiveste tempo suficiente para ter pena de ti. Arranja-te e veste-te. Estou ai daqui a uma hora e a reserva já está feita. Sem desculpas.” E desligou, não dando hipótese de Marie contestar.
Marie respirou fundo. Não lhe apetecia sair. Estava sozinha desde que Patrícia tinha voltado para a universidade um dia depois de Tiago, e tinha passado os dias a contemplar a ruina em que a sua vida se tinha tornado, com o silêncio da casa a pesar como uma lembrança do que tinha perdido.
Sabia que não ia adiantar refilar ou dizer que não. Lisa iria chegar e, a não ser que não lhe abrisse a porta, ia arrastá-la para fora de casa. E mesmo que não abrisse, suspeitava que ela telefonaria a Patrícia que lhe iria dar um sermão e o resultado final seria sempre o mesmo. Resignou-se, levantou-se da cama de onde ainda não tinha saído e foi tomar um duche, vestindo-se em seguida e arranjando-se minimamente, para tirar um pouco o ar de zombie que parecia ter na cara.
Quando Lisa chegou já estava pronta e a amiga mal a cumprimentou, arrastou-a para a rua entraram no carro e seguiram.
Não falaram muito no caminho para o restaurante, até porque Lisa sabia que não adiantaria muito estar com conversa fiada e, no carro, no meio do transito, não era sitio onde pudesse dar atenção a Marie.
Quando chegaram foram levadas de imediato para uma mesa perto de uma janela e, assim que pediram e o garçom se retirou, Lisa foi directa ao assunto:
“Então, o que é que vais fazer agora?”
A pergunta estava há uma semana em repetição continua na mente de Marie, mas esta não conseguia ver um caminho para a frente.
“Não sei. Sinceramente não sei.”
Lisa olhou para ela e disse finalmente.
“Ok. Então comecemos por algum lado. O que é que queres?”
“Queria que nada disto tivesse acontecido.”
“Pois, mas aconteceu. E agora não à volta a dar a não ser seguir para a frente. Já a minha avó dizia que não vale a pena chorar por leite derramado. Portanto, uma vez que aquilo que queres mesmo não é possível, o que é que queres?”
“Queria conseguir voltar a ter a minha família de volta. Queria ter o meu marido de volta.”
“Ok. Então já sabes o que queres. E o que vais fazer?”
“Não sei. Tenho dado voltas e voltas à cabeça, mas não sei como resolver isto.”
O garçom chegou com a comida, interrompendo-as, e quando se afastou foi Lisa quem continuou.
“Eu sei que não estás em condições de ser prática, por isso vamos por partes. O Alex partiu e não sabemos onde está. Sabemos que, pelas palavras dele, ele não se vai divorciar de ti. Mas tu podes divorciar-te dele daqui a um ano por abandono e tomar posse dos bens que ele deixou para trás. Já pensaste em relação a isto?”
“Não. Não quero sequer pensar em divorcio. Além disso, nem sei se daqui a um ano ainda terei os bens. Se ele deixa de pagar a hipoteca, daqui a uns meses estou a viver na rua…”
“Não sejas parva, isso não vai acontecer. Vais manter a casa, sim.”
“Mas como?”
“Vais trabalhar na segunda-feira.”
Marie ficou a olhar para Lisa como se esta tivesse duas cabeças. Lisa continuou.
“E vais trabalhar na segunda-feira por dois motivos: Para dares descanso à tua cabeça e focares-te noutras coisas e para teres o teu ordenado no fim do mês.”
Marie continuava a olhar para ela.
“Mas vou trabalhar onde?”
“Vais trabalhar na empresa do Fernando. Vais entrar como assistente da secretária dele e, quando já estiveres mais à vontade, vais partilhar responsabilidades com ela. Isto vai garantir que tenhas algum dinheiro. Se não chegar para tudo, eu ajudo-te com o que faltar.”
Marie continuava com um ar atónito e por fim perguntou:
“Porquê?”
Lisa olhou para ela com um sorriso e respondeu.
“Sabes, apesar do que aconteceu ser uma catástrofe para ti… A verdade é que aquela conversa que tivemos no sábado à noite na tua cozinha fez com que falássemos mais, acerca de coisas e sentimentos que nunca pensamos existir no outro. E se no próprio Sábado tinha já chegado a uma conclusão, ao longo da semana aquilo que fomos reafirmando só reforçou esta decisão. Eu não fazia ideia daquilo que se passava na cabeça do Fernando, pura e simplesmente assumia ele não só estava bem, como até gostava das nossas visitas ao clube. Descobrir de repente que ele odiava e que só ia por medo de me perder… Não vamos voltar ao clube. O nosso casamento está permanentemente fechado. Eu só preciso dele e não quero magoá-lo com isto mais uma única vez que seja.”
Marie anuiu e lisa continuou.
“Portanto, estranhamente, ambos temos uma enorme dívida para contigo. E depois de falarmos, e uma vez que eu fui parte interveniente nisto e me sinto também culpada de alguma forma, decidimos fazer todos os possíveis por te ajudar, da maneira que tu achares que queres seguir em frente. Portanto, para já tens um emprego.”
“Não sei que dizer…”
“Então aceita e não digas nada. Entretanto e voltando atrás, agora que sabes que não vais ficar sem um teto, queres divorciar-te dele daqui a um ano?
“Eu não me quero divorciar dele. Ponto final.”
“Pensei muito naquilo que o Tiago disse na Segunda-feira. E acho que ele tem razão. Acho que por mais que quisesses falar com ele e explicar, nada ia adiantar. Mas tu és a única pessoa que pode fazer o que é certo. E pode ser que, com tempo, se te atreveres a ser paciente, as tuas acções venham a falar mais que todas as palavras que lhe pudesses dizer.”
“Tens razão. Só não sei o que fazer…”
“Bem, uma vez que não podes fazer mais nada, ergue-te, luta e leva a tua vida como se ele tivesse simplesmente ido a trabalho para um lado qualquer para onde não te podia levar e para onde não há comunicações. E espera. E conta comigo, com o Fernando, e com a maior parte do grupinho das mulheres para estarmos lá para ti e para te ajudar.”
Marie anuiu, sentindo pela primeira vez desde Sábado uma esperança nascer dentro de si. Não estava sozinha e, quem sabe, talvez houvesse uma hipótese.
Passaram o resto do almoço a falar acerca da empresa do Fernando e o que era esperado dela, inclusive, quando ela já tivesse experiência, viagens de negócios a acompanhar Fernando. À medida que falavam, o entusiasmo de Marie aumentava e sentia-se mais animada.
Quando Lisa a deixou em casa ao fim da tarde, a solidão voltou, mas pelo menos, no meio de tudo, havia um propósito e já se sentia nervosa na antecipação da manhã de segunda-feira.
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