terça-feira, 26 de novembro de 2024

Consequências (XIX de XLIII)




Alex ajustava-se ao seu novo normal. Assim que chegara a quantidade de assuntos pendentes que precisavam de resolução era avassalador, devido ao facto de não haver ninguém na posição há bastante tempo. Isto foi de alguma maneira benéfico para ele, pois manteve-o focado, em alguns dias perto de vinte horas seguidas, não lhe dando tempo para pensar em mais nada.

Mas, ao fim de pouco tempo, à medida que foi arrumando a casa, foi descobrindo que tinha até bastante tempo livre. Não tinha era com que o gastar e foi nesses dias que aos poucos se foi permitindo pensar em tudo. Não se arrependia de nada… Bem, na verdade arrependia-se de ter levado Lisa para a cama e tê-la castigado daquela maneira. Ela não tinha culpa de nada, foi só apanhada sem querer no meio das mentiras e da traição de Marie. Mas a verdade é que ela não pareceu importar-se. Ficou mais surpreendida do que assustada e foi completamente submissa.

Tinha pena de ter deixado o carro para trás. Demorou anos a tê-lo depois de o ter comprado como sucata num ferro velho e ter acompanhado a meticulosa reconstrução. Um Shelby Mustang Fastback azul meia-noite com listas brancas do final da década de sessenta. Onde quer que acabasse, um dia, haveria de outro. 

Sim, porque sabia que não poderia voltar a casa. Se o fizesse, o mais provável era ser preso e levado a tribunal depois de Marie obter o divórcio por abandono. Não, a sua vida onde nascera e vivera tinha acabado. Ele nunca lhe daria a satisfação.

O facto de ter tempo e não ter em que o gastar começou a fazer estes pensamentos intrusivos começarem consumi-lo e começou a beber mais do que devia, tentando calar as vozes na sua cabeça.

“Tens tido umas noites duras, não?” Perguntou Miguel num dia em que o escoltavam para a sede da empresa.

“É assim tão óbvio?”

“Quando aqui chegaste estavas em forma, cansado… Agora pareces um morto vivo, e se nos primeiros tempos vi a carga de trabalho que tinhas, agora… estás pior.”

Alex ficou em silêncio.

“Se me permites…”

“Fala à vontade.”

“Eu sei em que circunstâncias é que vieste para aqui.” Alex olhou para ele com uma expressão interrogativa “Sei que foi algo que aconteceu de repente, que o teu nome apareceu e umas horas depois estavas aqui. Não sei ao que é que quiseste fugir…”

“Não fugi de nada. Diz antes que quis deixar algo permanentemente para trás.”

“Seja. Mas seja o que for… Aqui tens de largar isso.” Miguel apontou à sua volta “Eu sei que isto tem estado relativamente calmo, não tem acontecido nada aqui por perto e tu até deves pensar que é excessivo andarem cinco gajos contigo dentro de um carro para todo o lado…”

“Por acaso…”

“Mas garanto-te que não é. Já te perguntaste porque é que ninguém quer vir para aqui? Achas que é por isto ser uma pasmaceira?”

Alex sabia que havia razão para isto tudo, embora o aborrecesse sentir que todos os seus passos eram acompanhados.

“Dito isto, preferia que, se as coisas derem para o torto, tu estivesses em forma e capaz. E ainda me sentia melhor se soubesses manejar uma arma. Eu falei com a equipa e eles não se opõem que te juntes aos nossos treinos.”

Alex ficou admirado e olhou para os outros homens e todos assentiram.

“Nós treinamos todos os dias ao fim do dia com o resto da guarnição na sede. Chegas a casa mais tarde e treinas connosco. Mas há um senão… Ninguém vai abrandar por ti, portanto se achavas que fazias uns treinos antes, prepara-te.”

Alex assentiu.

“É uma honra juntar-me a vocês… mas se calhar, amanhã… hoje não ia ser um bom dia.”

Todos se riram. Quando serenaram, Miguel continuou.

“Outra coisa. Nós somos paranóicos com segurança. Mas sabemos que as noites são longas e solitárias… e frias. Se eventualmente precisares de algo para te aquecer as noites, diz-nos e nos tratamos. Não tens de te chatear e nós ficamos descansados. E também não tens de ser tímido. Não estamos à espera que sejas um monge.”

Alex riu. Curiosamente deu-se conta de que até agora não lhe passara sequer pela cabeça.

As noites de Alex melhoraram bastante, sobretudo por que ele passou a chegar a casa moído dos treinos, com dores musculares em sítios que ele não sabia que tinha ou que podiam doer, e caia na cama, repetindo a rotina no dia seguinte. Mas conforme os dias iam passando ele ia notando um cada vez maior vigor e uma diferença substancial no seu físico.


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