segunda-feira, 4 de novembro de 2024

Consequências (IV de XLIII)



Iam no carro em silêncio absoluto. Logo a seguir a entrarem e arrancarem ela pegou no telemóvel e esteve durante algum tempo a trocar mensagens com alguém enquanto ele se manteve completamente impávido com os olhos postos na estrada e sem lhe prestar atenção nenhuma. Ao fim de algum tempo ela pousou o telemóvel e deve finalmente ter notado o silêncio que havia no carro, com apenas o ronco do motor a providenciar algum ruido de fundo. Ao fim de algum tempo ela disse:

“Normalmente costumo ser recebida mais entusiasticamente.”

Ele não desviou os olhos da estrada e durante algum tempo manteve-se em silêncio acabando por responder, para surpresa dela:

“Não foi bem assim que imaginei que a noite acabasse.”

Ela notou a amargura na voz dele e achou prudente ficar em silêncio. Mas não se conteve durante muito tempo.

“Estava a trocar mensagens com a tua mulher. Estava-lhe a dizer que fui a sortuda comtemplada.”

“Sortuda?”

“Sim. Não imaginas há quanto tempo quase todas suspiramos por ti. Há anos que insistimos com a Marie para te convencer, mas ela sempre disse que tu nunca concordarias…”

“Ela tinha razão.” Interrompeu ele de uma forma seca.

“Mas quando soubemos que hoje seria o dia, todas ficámos em pulgas. Quando o meu numero foi chamado todas me fuzilaram com olhares de inveja. Devo ter sido a mulher mais invejada da noite.”

Ele não respondeu, parecendo continuar absorto em mil pensamentos. Ele não era nada como Marie tinha dito. Não estava divertido, nem sequer estava afável. Ela começou a perceber que algo não estava bem.

“Estás bem?” acabou por lhe perguntar.

Um sorriso meio sinistro e um brilho passaram-lhe pelo olhar, algo que a assustou um pouco, mas ele acabou por dizer:

“Hei-de ficar.”

Chegaram a casa dele, ele entrou com o carro na garagem, fechou a porta da mesma, saiu do carro e entrou em casa, não esperando por ela, num gesto que a deixou completamente desconcertada. Todos os homens do grupo com quem ela tinha estado tinham sempre um brilho de luxuria no olhos quando percebiam que passariam a noite com ela. Todos faziam os possíveis por a tratar como uma princesa. Ela sabia que causava inveja nas mulheres e luxuria nos homens por onde quer que passasse, mas este homem, o mais desejado, parecia nem registar a sua presença. Algo estava, de facto, muito errado neste quadro.

Ela saiu do carro e entrou na casa e deu com ele na cozinha enquanto tirava gelo do frigorifico para um copo.

“Queres beber alguma coisa?” perguntou ele, não parecendo importar-se muito com a resposta.

“Acompanho-te no que beberes.” Respondeu ela, sentido que não sabia o que havia de fazer. Uma suspeita formava-se na sua mente e não se conteve.

“Tu não sabias de nada, pois não?” perguntou meio a medo.

Ele olhou-a finalmente nos olhos e ela assustou-se com o fogo que viu no seu olhar. Normalmente esse fogo era luxuria por si, mas percebeu que aquilo que estava por baixo da superfície não era tão simples.

“Não, não sabia. E quando percebi foi tarde demais.”

Ela percebeu finalmente o porquê de ele estar assim.

“Ouve,” disse ela “eu sei que podes não acreditar no que te vou dizer neste momento, mas a Marie ama-te.”

Ele desatou a rir, mas desmanchou-se de uma maneira que ela não estava à espera. Mas não era um riso de felicidade, era um riso irónico.

“Ama-me!” acrescentou enquanto lhe passava um copo de Bushmills de 21 anos para a mão. A desilusão na voz dele era evidente.

“Ouve, ela casou contigo sem nunca ter tido outro homem e nunca te foi infiel até hoje.”

“Esperas que eu acredite nisso?”

“Espero porque é verdade. Sabes, quando ela soube do grupinho exclusivo, ficou entusiasmada, mas disse logo que era impossível porque tu jamais concordarias em ir. E até à semana passada todas estávamos convencidas que nunca a veríamos numa das festas. Ela ama-te, mas sempre teve a curiosidade de estar com alguém diferente. Como seria… Quando ela disse que vinha esta semana também disse que provavelmente seria a única vez…”

Ele olhava-a com uma expressão completamente em branco. Ela continuou:

“Não sabes o quanto me senti sortuda por ter sido eu a ser sorteada para ti.”

Ele olhou para ela com uma expressão indecifrável no rosto, mas não respondeu e um silencio embaraçoso caiu entre ambos. Ao fim de algum tempo, algo incomodada ela perguntou:

“Podes dizer-me onde é a casa de banho?”

Ele limitou-se a apontar uma porta e ela levantou-se e seguiu para lá. A noite não estava de todo a ser o que ela esperava. Entrou na casa de banho e só pensava para si “Marie, o que é que foste fazer…”. Olhou-se ao espelho, compôs-se e pensou “Tenho mesmo de o conseguir seduzir, ou isto vai acabar em desastre”. Deslizou para fora das suas roupas ficando apenas com a sua lingerie que tinha escolhido com cuidado. Observou-se novamente ao espelho e pensou para si “Só mesmo se for um santo é que ele me vai negar” e saiu da casa de banho.

Encontrou-o na sala, sentado numa poltrona com o olhar fixo e vazio, parecendo estar completamente ausente e perdido nos seus pensamentos. Ele nem sequer registou a sua entrada, nem olhou para ela. Não se deu por vencida, colocou-se à sua frente, impondo a sua presença. Ele finalmente pareceu nota-la, mas o facto de estar quase nua não provocou qualquer reacção nele. Ela ajoelhou-se à frente dele, deslizou as mãos pelas suas pernas e subiu al longo do seu torço. A única reacção dele foi beber mais um gole de whisky. Ela começou a desapertar-lhe a camisa e ele continuou sem qualquer reação, não a incentivando nem lhe dizendo para parar. Ela continuou até lhe abrir completamente a camisa. Marie não tinha mentido, este homem estava numa forma física não muito comum para a idade. Começou a beijá-lo no fundo da barriga e foi subindo pelo seu tronco até ao seu pescoço, mas, apesar de ele não a parar, continuava sem qualquer reação.

Ela finalmente olhou-o nos olhos.

“Isto vai acontecer uma única vez. Eu hoje sou tua, e tu és meu.” 

Ele olhou-a com uma expressão de quase desdém na cara. Ela nunca se tinha sentido como se sentia agora. Mas continuou:

“Neste momento a Marie está com outro homem a aproveitar a sua única noite de liberdade. Porque é que não aproveitas também a tua?”

Ele olhou-a durante uns minutos enquanto ela o começava a acariciar por cima das calças. De repente agarrou-a e deu-lhe um beijo voraz que a deixou completamente surpreendida e sem folego. Depois ele levantou-se, pegou nela ao colo e arrastou-a para o quarto.