Cinco e meia da tarde.
Estacionava o carro em
frente a casa. Parámos na entrada do prédio para eu recolher o correio e
subimos em seguida as escadas até ao primeiro andar e entrámos. A casa tinha um
leve cheiro a mofo por estar fechada há tanto tempo. A última vez que cá tinha
estado tinha sido entrada por saída, quando vim buscar o portátil. Pousei o
correio na mesa da sala e apressei-me a ir abrindo as janelas, à medida que lhe
mostrava a casa, e deixando entrar ar e luz.
De seguida fui ver o
correio, cheio da publicidade e das contas de sempre, com um ou outro ocasional
convite misturado, que ainda se davam ao trabalho de me mandar. Fui descartando
envelopes um a um. Lilith estava sentada no sofá ao meu lado enquanto fazia
isso. Quando dispensei uma carta com um convite, ela pediu-me:
– Posso ver isso?
– Podes, mas não é
interessante.
– É o quê?
– É um convite para uma
festa qualquer.
Ela abriu o envelope.
– Uma exposição de
pintura. Parece interessante…
– Achas? Para mim nunca é…
– Porquê?
– Porque estão lá sempre
as mesmas pessoas, a pseudo-elite intelectual com as suas grandes ideias e os
seus julgamentos do trabalho dos outros, bem como a gentinha do jet-set que não tem talento para nada a
não ser para aparecer.
– Não me digas que nunca há
gente interessante?
– Claro que não digo. Há
pessoas interessantes. Mas acabas por passar muito mais tempo a falar com os
outros…
– Devíamos ir.
Olhei para ela de soslaio.
– Porquê?
– Porque era giro e ficou
claro que não gostas de discotecas e afins e eu quero ver gente.
– Mas temos de ir a rigor
e tudo.
– Sim, mas eu posso levar
qualquer coisa da tua ex. Ainda aí tens roupas dela, não?
– Tenho, ela não levou
nada.
– Então… Vais ver,
arranjamo-nos. Vais-te alinhar, que estás uma desgraça, vais tomar um banho,
fazer a barba, pôr um bom after shave.
Eu vou vasculhar os teus armários, vou-te escolher uma roupinha catita para
quando saíres do banho e ponho na tua cama. E entretanto tenho a certeza de que
arranjo qualquer coisa para mim também. Calculo que não tenhas cá nada que se
coma…
– Pois, por acaso não
tenho.
– Então vá, vamo-nos
arrumar e vamos jantar fora com tempo. Anda vai…
E despachou-me. Não
adiantava argumentar fosse o que fosse e eu sabia-o.
Levei roupa interior
comigo para a casa de banho do meu quarto, onde tomei um duche longo e bem
relaxante, por sinal. Fiz a barba com calma, com atenção, dando-me importância,
coisa que raramente fazia. Penteei-me com cuidado. Pensava «Se vou sair com
esta mulher é melhor caprichar um bocadinho!».
Quando saí da casa de
banho tinha em cima da cama a roupa que ela tinha escolhido para mim. Um fato
preto liso com um casaco de corte cintado, uma camisa branca com riscas
verticais espaçadas em cinzento claro e uns sapatos. Vesti-me com calma. Quando
acabei dei mais um toque no cabelo. Finalmente saí para a sala, já vestido. Ela
aguardava-me.
Quando a vi fiquei parado,
literalmente parado. Tinha apanhado o cabelo deixando apenas um longo caracol a
desenrolar-se de cada lado da face, abaixo do ombro, emoldurando-lhe o rosto,
mas realçando o pescoço comprido e elegante. Usava um vestido que só me
lembrava de ter visto uma vez a Diana, muito decotado, a realçar‑lhe o busto,
num cetim púrpura que caía naturalmente ao longo das curvas do seu corpo
dando-lhe um ar imperial e ao mesmo tempo suave. Os realces da luz no tecido
aumentavam ainda mais a sensação de fluidez e de que ela flutuava em vez de
andar. Nos pés uns sapatos de estilo italiano, clássicos, mas que alimentavam
na perfeição a ilusão de que as suas pernas seriam mais compridas, aumentando o
efeito de elegância. Pela primeira vez via-a maquilhada, com um rímel preto e
uma sombra castanha que fazia com que os seus olhos azuis, já de si ofuscantes,
parecessem atravessar tudo o que tocavam. Nos lábios o batom castanho brilhante
realçava o desenho tornando-os ainda mais carnudos. Estava linda, bela, e quase
não me apetecia sair só para ela não passar a vergonha de ser vista comigo.
Ela caminhou para mim,
alinhou-me o colarinho da camisa e desabotoou-lhe mais um botão.
– Assim ficas melhor, mais
desportivo – disse. – Vamos então?
Encolhi os ombros.
– Vamos.
Jantámos num restaurante
perto de onde era a galeria de arte. Já passava das dez e meia quando
finalmente nos dirigimos para lá. Mostrámos o convite à entrada. Mal entrámos,
ela sussurrou-me ao ouvido:
– Vou retocar a
maquilhagem. – E afastou-se rapidamente deixando-me sozinho num sítio onde eu
não queria estar. Olhei em volta. Localizei o bar, dirigi-me lá, sentei-me num
banco alto, pedi um whisky de malte.
Deixei-me ficar virado para o bar, sem vontade de ver ninguém ou de ser
incomodado. Apenas queria fazer o meu tempo ali. Lilith que se divertisse, se
quisesse.
– Olha só o que arrastaram
da rua para aqui…
Uma voz que eu já não
ouvia há 10 anos. Continuava carregada com o mesmo desprezo que tinha na fita
gravada. Continuava inconfundível. E se a minha noite já não mostrava grandes
perspectivas, acabara de ser pura e simplesmente arruinada. Bebi o whisky de um trago. Precisava da
anestesia só para me virar na cadeira. Voltei-me.
– Olá, Diana – disse mesmo
antes de a ver, enquanto me voltava.
E depois vi, e os dez anos
volvidos apenas pareciam ter aumentado nela qualquer coisa de mau, continuava a
ver desprezo nos seus olhos. Era ainda uma mulher bonita, mas a sua pele
acusava os anos passados. Tinha o cabelo pintado de loiro platinado, o que não
lhe ficava mal, uma vez que tinha a pele clara, mas preferia de longe vê-la com
o seu castanho cobre natural. Estava mais magra do que eu me lembrava dela.
Usava um vestido justo muito trabalhado em tons de bordeau e preto, comprido, quase até aos pés.
A acompanhá-la estava
alguém que eu não fazia ideia de quem era. Um homem elegante, de meia-idade,
alto e com o rosto de traços vincadamente masculinos e simétricos.
– Então? Resolveste sair
de debaixo da pedra onde tens estado enfiado?
– Não, por acaso, não. Fui
arrastado.
– Arrastado? Mas que bem.
Vejo que não mudaste nada.
– Acho que mudei o
suficiente. Já tu estás, obviamente, quase na mesma.
– Quase?
– Sim, quase.
– Porquê quase?
– Porque estás mais velha.
– Também não estás mais
novo…
– Pois não, mas ao
contrário de ti, isso não me preocupa – disse com um sorriso.
Era curioso o que sentia
neste primeiro frente a frente ao fim de todos estes anos. Sentia que
finalmente conseguia encará-la e não digo que a desprezasse como ela o fazia a
mim, mas sentia-me totalmente desprendido dela.
E eis que Lilith entra
pela sala e caminha na minha direcção com a segurança habitual. É notório o
efeito que ela tem em todos à medida que atravessa sem olhar para ninguém.
Desviei os olhos de Diana e olhei-a. Ela sorriu.
Veio direita a mim, passou
pela Diana e pelo seu acompanhante, encostou-se a mim, abraçando-me e disse:
– Tiveste saudades minhas?
– Muitas… – respondi.
Olhou-me com um olhar
maroto.
– Ainda bem – disse, e
dizendo inclinou-se para a frente beijando‑me com suavidade, ignorando e
fazendo-me ignorar por completo tudo o que nos rodeava. Depois afastou-se um
pouco ficando com a cara a centímetros da minha, os seus olhos nos meus, uma
expressão de miúda que está prestes a fazer uma travessura e perguntou:
– Não me apresentas os
teus amigos?
– Claro… – disse.
Ela virou-se para eles
permitindo que eu fizesse as apresentações.
– Querida, esta é a Diana
Almeida, a minha ex-mulher, e este senhor é o…
– Ricardo… – apressou-se
ele cumprimentando-a. – Ricardo Gomes.
Virei-me para eles e
apresentei-a.
– Esta é Lilith.
– Lilith? – Perguntou
Diana – Nome interessante.
– É de origem hebraica.
– É judia, então?
– Pode dizer-se que sim,
mas não propriamente. Creio ser mais um bocadinho de cada cultura que vou
absorvendo.
– E o que é que uma jovem
como você poderá ter a dizer do mundo?
– Muita coisa, sabe. A
idade não se mede pela pele mas pelo que se viveu, não acha? – Não esperou pela
resposta e virou-se para mim: – Querido, vamos dar uma volta por aí?
– Ainda estou a acabar a
bebida, e já não via a Diana há dez anos. Não queres ir tu indo?
– Sozinha? Achas? Não,
sozinha não! – E com isto lança um olhar ao Ricardo que foi de tal forma que
quase podia jurar que os joelhos dele tremeram. – Ainda há para ai alguém mal
intencionado…
– Linda, eu sei que davas
conta dele, se houvesse.
– Mas não, amor. Sozinha…
Já sei! Só se o Ricardo me acompanhar e assim ainda falavas um bocadinho com
ela. Que dizes?
– Se o Ricardo não se
importar…
– Claro que não me importo
– disse Ricardo solícito, se calhar até demasiado solícito.
– Então vamos… – disse ela
dando-lhe o braço. – Até já, amor. – E seguiram os dois pela galeria.
Ficamos a vê-los ir, eu e
Diana, e vimo-los desaparecer por entre as pessoas que se juntavam com
opiniões, de certeza esclarecidas, em frente aos quadros. Já eu estava sem
qualquer curiosidade para os ver, muito menos para encontrar algumas pessoas
com quem teria de manter conversa de circunstância.
Estava também sem perceber
muito bem o que queria Lilith. Percebi que queria jogar de alguma maneira, e
fui a jogo com ela, mas o objectivo escapava-me. Neste momento estava sozinho
com a última pessoa no mundo com quem queria falar, e embora não me sentisse tão
desconfortável como imaginava quando via mentalmente este encontro, a verdade é
que ter uma conversa com ela era quase impossível.
Sentei-me novamente no
banco alto, de costas para o bar, pedi outra bebida, e deixei-me estar
mergulhado nas minhas considerações. Foi Diana quem quebrou o silêncio.
– Onde é que desencantaste
esta miúda?
Miúda. Eis um termo giro
para a definir.
– Bateu-me à porta no
outro dia.
Ela riu.
– Caiu-te do céu?
– Bem se pode dizer que
sim.
– Só mesmo tu… Mas não
achas que ela é, sei lá, talvez um pouco nova para ti?
– Se eu te respondesse
talvez ficasses surpreendida. Além disso, não és tu que gostas deles mais
novos? Aliás, até estou surpreendido com o Ricardo. Que idade tem ele? Trinta e
cinco? Quarenta? Não está já velho demais para ti? Ou já te sentes assim tão
velha?
– Ora, o Ricardo é apenas
um amigo…
– E ele sabe disso? Ou
continuas com os velhos hábitos de ir dando umas quecas por fora?
– Porquê a pergunta?
Chateia-te o que eu faço ou deixo de fazer?
– Não, de maneira nenhuma.
Só queria perceber se mudaste. Mas as pessoas não mudam, não é? Só se adaptam.
Ela riu-se com uma
gargalhada sonora.
– Pois não. Basta olhar
para ti. Continuas tão profundo…
Era verdade. Ela não
mudara e eu também não. Ela adaptara-se, depois do nosso divórcio, para tentar
manter um nível de vida a que se habituara, e eu adaptei-me à minha solidão e
reclusão. Tinha deixado de gostar de pessoas, tornara-me desconfiado e
selectivo, usando sempre a Diana como medida para alguém que eu conhecesse. E
apercebia-me agora que tinha errado. Cada pessoa era por si só, era um conjunto
único de defeitos e virtudes, irrepetível, mesmo quando essa pessoa quer ser
igual a alguém. Ao estabelecer pontes de comparação neguei inevitavelmente a
hipótese a qualquer dessas pessoas de chegarem até mim. Só havia uma Diana, e
essa estava à minha frente neste momento.
A percepção de tudo isto
fez-me rir. Dei uma gargalhada com vontade. Acredito que ela pensasse que me
ria em resposta a ela, mas não, ria porque me apercebi que passei dez anos da
minha vida numa solidão auto-imposta sem qualquer motivo.
– Acho que não tanto como
tu julgas… – acabei por responder. – Mas diz-me, quem é este Ricardo?
– Estás assim tão curioso?
– Um bocadinho. Sempre me
apercebo o porquê de ele ser tão… «velho» para ti.
– É filho do dono de uma
rede de agências imobiliárias, é formado em economia, tem dinheiro e como viste
não é nada mal jeitoso…
– Tem cuidado, não vá
aparecer por aí uma caçadora de homens qualquer que te roube o homem…
– Sabes que ainda tenho os
meus talentos.
– Acredito que sim, mas
não estás mesmo a ficar mais nova, e ao virar da esquina há sempre outra versão
de ti, mais nova, com a pele mais suave e que tem mais talentos que tu. E não
te esqueças que aquilo que queres há mais quem queira…
– Meu querido – disse ela
com a voz carregada de ironia –, desde que ele me dê o que eu quero, o que é
que me importa se ele tem mais uma ou duas ou uma dúzia de amantes por fora?
– Se fosse a ti
importava-me. Há uma altura em que temos demais e começamos a descartar o que
achamos supérfluo…
– E eu pareço-te
supérflua?
– De onde eu estou, cada
vez mais…
Ela acusou o toque. Viu
que qualquer efeito que tivesse tido em mim no passado se tinha desvanecido e
eu cheguei com agrado à mesma conclusão.
– E se fôssemos à procura
dos nossos pares? – Disse ela desviando a conversa. Pousei o copo vazio e
concordei.
– Vamos.
Fomos percorrendo a
galeria, dando atenção a um ou outro quadro, sem nos determos por muito tempo à
frente de nenhum. Fui encontrando caras conhecidas aqui e ali, que me iam
cumprimentando e fazendo as exclamações e perguntas da praxe, «Há quanto
tempo…», «O que é feito…», levando-me sempre às mesmas respostas vagas que
procurava evitar. Ao fim de um bocado localizámos o par que procurávamos.
Estavam em frente a uma
pintura e falavam acerca de algo. Lilith estava de braço dado com ele e atraía,
como sempre, todas as atenções em volta, mas em especial as de Ricardo. Este
olhava para ela directamente, numa tentativa clara de sedução, e fosse o que
fosse que ela lhe dizia, bebia todas as palavras dela. Ela olhava-o
directamente com aquele olhar magnético e falava-lhe com um sorriso. Era óbvio
que ele estava completamente enfeitiçado por ela.
Via a expressão de Diana,
a mulher segura que ela costumava ser, que brincava e seduzia quem queria a seu
belo prazer, e que de repente se dava conta da sua própria fragilidade e via à
sua frente a confirmação das minhas palavras. Eram notórios a ira e o ciúme nos
seus olhos. Ela podia não dar grande importância ao Ricardo, mas dava-se a si
própria. Sentia-se despeitada, traída. Era transparente nela, tanto como o era
a maneira como tentava manter a compostura.
Pela primeira vez
apercebi-me da fragilidade dela. Ela, que sempre tinha sido tão grande, era
afinal tão oca que uma pequena coisa podia fazê-la ruir por dentro e dei comigo
a pensar como foi possível dar-lhe tanta importância por tanto tempo.
Lilith murmurou qualquer
coisa ao ouvido de Ricardo, como se houvesse entre os dois uma cumplicidade de
há muito. Diana não se conteve e chegou-se a eles.
– Então… – disse com um
tom irónico na voz –, divertidos?
– Sim – afirmou Lilith –,
o Ricardo é uma excelente companhia e um verdadeiro cavalheiro.
– Eu sei – disse Diana. –
É por isso que gosto tanto dele.
– É melhor que o trate bem
– e dizendo isto, olhou bem nos olhos de Ricardo, avisando: – Pode sempre
aparecer alguém que o queira roubar…
Ricardo mordeu o lábio. Eu
ri-me por dentro. Os olhos de Diana inflamaram de ódio.
– Não se preocupe –
continuou Lilith –, não seria eu a fazê-lo de certeza. – Foi visível a
desilusão nos olhos de Ricardo. Ela largou-o e dirigiu-se a Diana – Sabe, se eu
quisesse alguém sem ser o Miguel – pôs-lhe a mão na cintura, acima da anca –,
preferia, sem dúvida – puxou-a suavemente para si, e Diana deixou-se ir, completamente
incapaz de parar, ou resistir – … uma mulher… – os corpos delas colaram-se,
Ricardo estava de boca aberta, toda a galeria ficou em suspenso como tinha
ficado a discoteca, todos os olhos postos nelas, Diana suspendeu a respiração –
como tu.
Os lábios das duas
tocaram-se tão ao de leve que quase não deu para ninguém se aperceber do beijo.
Rolaram algumas lágrimas dos olhos de Diana, fazendo linhas na sua maquilhagem
carregada. Lilith largou-a.
– Como tu não – disse. –
Talvez uma mulher com mais vida. Com mais mundo. Talvez alguém que valesse a
pena e não fosse tão absolutamente oco e movido por interesses pessoais. Talvez
uma mulher que tivesse um fundo bom.
As lágrimas corriam pela
cara de Diana enquanto ouvia isto. Lilith voltou-se para mim.
– Querido, já conversaste
tudo com ela?
– Sim, linda. Acho que já
dissemos tudo um ao outro.
– Então, deixemo-los.
Abraçou-se a mim e
afastámo-nos deles. Seguimos como se nada se tivesse passado. Ricardo ficou
onde estava, atónito com o que presenciara, espantado talvez pela maneira como
tinha sido ignorado. Diana, ao fim de alguns instantes de imobilidade, saiu
apressadamente da sala, fazendo questão de não olhar para ninguém. Aos poucos o
ambiente voltou ao normal e as atenções sobre nós esbateram-se.
– Foste cruel – disse eu a
Lilith.
– Fui mulher.
Ri-me. Era óbvio o que
dizia. Sim, tinha sido sobretudo mulher.
– Por momentos pensei que
levavas o Ricardo contigo e lho roubavas.
– Sabes – disse ela –,
isso não teria grande significado. Não lhe roubaria algo que já não é dela de
qualquer maneira.
– Como assim?
– Para o Ricardo ela era
apenas uma boa queca, uma conquista fácil, mas que, quando ele estivesse
cansado seria facilmente substituível. Estaria com ela enquanto ele quisesse o
que ela tinha para dar e não aparecesse outra qualquer mais apelativa. Para ela
o Ricardo era apenas um meio para um fim, não significava nada.
– Concordo contigo, aliás,
disse-lho antes de irmos ter convosco.
– Pois. Mas sabes, dizes
que eu fui cruel, mas se calhar nem tanto. De certa forma posso até ter sido
piedosa.
– Porquê?
– Porque agora ela tem
tudo na mão. Acho que se apercebeu de muita coisa hoje, mas sobretudo
apercebeu-se que tem de mudar. E se ela o fizer, então fui piedosa. Se ela
teimar em seguir o caminho que tem seguido até aqui, então fui cruel para ela.
Mas não para o resto do mundo.
A verdade das palavras
dela era clara. Inegável, mesmo.
– Sabias que a Diana
estaria aqui hoje?
– Ora, Miguel, achas que
sim?
– Não há acasos, pois não?
Quer dizer, contigo não há acasos.
Ela sorriu.
– Quem sabe, Miguel. Mas
uma coisa eu sei.
– O quê?
– Estás diferente. Por
dentro estás diferente. Estás mais parecido com quem foste.
– E que sabes tu de quem
eu fui?
– Eu sei muita coisa,
Miguel.
Não duvidei e achei melhor
não perguntar mais. Podia não estar ainda preparado para as respostas.
Continuo a ler com interesse. Mas hoje não dá mais.
ResponderEliminarAbraço e saúde