terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Lilith - Prologo

 

Não há nada pior do que olhar para uma página em branco sem ter ideia de como começar a preenchê-la.

Estava ali há cerca de dois meses, com prazos a aproximarem-se a uma velocidade vertiginosa e com um bloqueio como nunca tinha tido. Isolara-me na casa de praia, sem telefones, sem televisão, sem internet, sem computadores, apenas com uma máquina de escrever já velha e o carro que me permitia ir semanalmente às compras. De resto, reclusão absoluta, com os dias passados, na maior parte das vezes no terraço das traseiras, entre o rugir das ondas do mar de inverno que impregnavam o ar de maresia e as folhas de papel em branco, que eu começava já a olhar com algum desespero.

Em dois meses não tinha escrito uma única linha de jeito, e a um mês do prazo de entrega do livro já mal tinha tempo para o escrever, quanto mais delinear uma história.

Tinha plena consciência de quão grave seria falhar, de quanto esperavam de mim. E era precisamente esse receio que parecia bloquear-me ainda mais.

Aquele dia não era diferente de outro qualquer desde que me tinha desterrado voluntariamente naquele lugar. Estava no terraço sob o Sol de Inverno e a leve brisa fresca que passava, mas sem os apreciar, de tão absorvido e obcecado que estava com a folha de papel em branco que tinha à minha frente.

Eis que alguma coisa me chama a atenção pelo canto do olho, um leve movimento que não estava lá antes. Desloquei o olhar nessa direcção e vejo-a surgir por entre as dunas, com passadas seguras na areia desta praia deserta. Parou onde as dunas se desfazem em areal de praia, tirou todas as roupas e desceu nua em direcção à água. Não parecia incomodada pela brisa fresca nem atemorizada pelo revolto das ondas.

Segui-a à distância com o olhar, não percebendo mais do que a silhueta que se dava ao mar e que se deleitava nele. Depois saiu, subiu pelo areal até onde tinha deixado as roupas e deitou-se ainda molhada na areia esperando que o sol a secasse.

Por fim levantou-se, sacudiu a areia, vestiu-se e partiu.

Fascinou-me aquele momento.

Ela estava distante o suficiente para que eu não a conseguisse ver com clareza, nem distinguir roupas ou até as suas formas nuas quando foi à água, mas perto o suficiente para que conseguisse seguir os seus movimentos.

E foi quando ela partiu que resolvi escrever estas linhas…

2 comentários:

  1. E a história que tardava em vir apareceu. Vou em frente.
    Abraço e saúde

    Á margem: ainda tem o meu email? Quando puder mande-me a sua morada.

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  2. Como já disse noutro comentário, isto já tem uns anos. Foi acabado em 2009/10 e publicado em 2011 por uma editora já defunta.

    Vou ver se tenho :)

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O QUÊ?!?!? ESCREVE MAIS ALTO QUEU NÂO T'OUVI BEM!