Onze e trinta da manhã.
Parei para pensar no que
ela acabara de me dizer, embora me sentisse algo confuso. Podia ver a lógica do
que me dizia mas, embora não fosse particularmente religioso, sentia o conflito
entre tudo isto e uma vida inteira de cultura herdada dos meus pais e avós. Ela
olhava-me directamente nos olhos, como que para me assegurar de que o que dizia
era verdade ou, pelo menos, a verdade em que ela acreditava. Mas cada afirmação
dela suscitava mais dúvidas.
– Então quem é afinal
aquele a quem chamaste criador?
– Chamei-lhe criador
porque foi o meu criador, mas não foi o criador de tudo. Diz-me uma coisa, quem
é o criador de uma casa? O arquitecto ou o engenheiro que a constrói?
– Bem, do meu ponto de
vista é o arquitecto. O engenheiro limita-se a executar.
– Exacto. O criador é quem
cria o conceito, não quem o executa. A partir do momento em que existe a ideia
de algo, esse algo poderá ser concretizado num qualquer ponto no futuro. Desde
que o Homem olhou para a Lua que quis ir lá. Júlio Verne concebeu uma maneira
de isso acontecer, e se pensares bem o Homem chegou lá de uma maneira não muito
diferente da ideia que Júlio Verne teve.
– Queres com isso dizer
que Deus é o criador do conceito?
– Claro. O que os maçons
dizem está certo. Ele é o grande arquitecto. Mais, como qualquer criador, ele
não está dependente da sua criação, quanto muito a sua criação estará
dependente dele, ou nem sequer isso. Mas tal não impede, de forma alguma, que
Ele tenha o crédito pela sua criação.
– Então, nesse caso, o teu
criador é uma espécie de construtor?
– Sim. O meu criador
executa o plano do arquitecto e como tal, enquanto o plano não estiver
executado na totalidade, está dependente dele. O meu criador está dependente da
estrutura do universo.
– Percebo, mas só ainda
não percebi onde queres chegar com isto tudo…
– É simples. No capítulo
um do «Génesis» tens a descrição da elaboração do conceito, do plano e, como tal,
está tudo planeado desde o princípio até ao fim dos tempos, e acaba com a frase
que diz simplesmente «E viu Deus tudo quanto tinha feito, e eis que era muito
bom; e foi a tarde e a manhã, o dia sexto». O trabalho de Deus em relação ao
universo acabou aí.
– Mas nesse caso, se tudo,
mas mesmo tudo está incluído nesse plano, do princípio ao fim, como é que
explicas o livre arbítrio?
– O livre arbítrio é
inconsequente. Olha para o universo. Já cá estava antes de chegares e
continuará cá depois de partires. Achas-te assim tão importante para que
qualquer decisão tua altere tudo isto? Achas que se o sistema solar não existisse
isso teria um impacto significativo? Achas que se a galáxia não existisse se
notaria assim tanto? Nós somos inconsequentemente pequenos e o nosso problema é
que somos orgulhosos demais para lidar com essa pequenez. Já nos considerámos o
centro do universo e, afinal, vê lá que somos apenas um planeta pequeno em
órbita, à volta de uma estrela mediana na periferia de uma galáxia também periférica.
O universo foi criado há muito tempo e segue a sua evolução até ao seu
desaparecimento. Pelo meio, algures, estamos nós.
– E quer isso dizer que…?
– Quer isso dizer que
Darwin estava certo, que a ciência está certa, mas que a Bíblia está certa também.
Ela fez uma pausa e
deixou-me reflectir. Realmente, para quem dispunha da eternidade, fazer o mundo
em sete dias parecia algo de apressado e absurdo. Tinha toda a lógica a
corrente científica que defendia e estudava a evolução das espécies, coisa que
ainda hoje é observável.
– Mas então e o mito da
criação? – Perguntei ao fim de algum tempo.
– Em primeiro lugar, não é
um mito. Se o fosse, eu não estaria aqui à tua frente. É apenas uma história
contada à luz do entendimento possível na altura. Mas basta pensares nisto; se
a nossa espécie, homo sapiens, já
existe há cerca de cem mil anos com todas as capacidades que tem, porque é que
demorou mais de noventa por cento do seu tempo de existência até chegar à
primeira civilização?
Olhei para ela.
– Foi por uma influência
externa? – Perguntei.
– Foi por causa de
Yahvé.
Bom, este leu-se melhor. Compreendo que os capítulos sejam grandes mas eu tenho apenas 5% de visão num olho que já sofreu 5 cirurgias, e 0% por cento no outro. Ler capítulos grandes ainda por cima sem ser a preto e com a letra tão pequena, deixa-me de rastos.
ResponderEliminarAbraço e saúde
Elvira. Compreendo perfeitamente e apenas posso agradecer o esforço que faz :) Mas vou-lhe ensinar um truque: Se colocar o dedo em cima da tecla ctrl e depois rodar a roda do rato para a frente e para trás pode alterar o tamanho do que lhe aparece no ecrã, inclusivé as letras :) Um bem Haja, Elvira :)
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