sexta-feira, 20 de setembro de 2024

Renascimento (XI de XL)



O enorme todo o terreno preto fosco parou na rua deserta em frente ao estabelecimento do Zé, que, meio sobressaltado levantou os olhos das palavras cruzadas que fazia no jornal. Reconheceu de imediato Miranda quando esta literalmente desceu do lado do condutor, mas ficou surpreendido de ver a porta do passageiro abrir e sair outra mulher.

Desta vez nenhuma delas vinha vestida de forma espampanante, apenas de calças de ganga, t-shirt e ténis com um pequeno salto, as duas vestidas quase de igual, mas era óbvio que não eram peças de pronto-a-vestir, da maneira como assentavam.

Miranda dirigiu-se directamente ao estabelecimento, seguida da outra que olhava em volta, tentando absorver o que via.

Miranda entrou sorridente no estabelecimento e dirigiu-se-lhe de imediato.

-Hi, Zé. – disse com um sorriso enquanto lhe esticava a mão.

-Olá Miranda. – Devolveu ele o cumprimento com um sorriso, apertando-lhe a mão.

Miranda apontou para a amiga.

-Cassandra. – Disse simplesmente, enquanto esta parava de olhar em volta, olha para ele com um sorriso e lhe estendeu a mão, que Zé apertou também.

-Muito gosto. – disse.

-Two cofees, please? – disse ela, fazendo o numero dois com a mão.

Zé pegou num copo alto de vidro, olhando para ela com um ar inquiridor, mas ela acenou que não e apontou para as chávenas. Zé sorriu, pôs dois cafés a tirar e colocou os pires no balcão.

Serviu-lhes os cafés, que elas começaram a beber com deleite.

Por fim Miranda perguntou:

-Rob?

Zé pensou um pouco e fingiu tocar e depois apontou para longe.

-Pelos vistos o Rob está a tocar algures. – disse Miranda a Cassandra.

-A tocar?

-Sim, a banda dele toca em alguns concertos por aqui.

-E onde?

Zé, como se tivesse entendido estendia já um mapa no balcão. Apontou para o sítio onde estavam e percorreu uma estrada com o dedo para uma povoação próxima.

Zé apontou para si próprio e depois para a povoação, dando a entender que também iria para lá. Miranda apontou para o relógio. Zé mostrou-lhe os dez dedos e depois fez um sinal entre si e a direcção da povoação. Miranda assentiu.

Sentaram-se enquanto o Zé desligava as luzes e a máquina do café. Depois este convidou-as a sair e trancou tudo. Fez-lhe sinal para irem para o carro e esperar, o que elas fizeram.

Zé apareceu pouco depois numa pick-up de caixa aberta com um aspecto bastante gasto, fazendo-lhes sinal para o seguirem. Fizeram alguns quilómetros devagar, através de estradas estreitas e sinuosas onde por vezes só dava para passar um carro, até chegarem à entrada de uma povoação onde a estrada estava cortada e um polícia desviava os carros, ou para uma estrada alternativa, ou para um enorme campo que servia de parque de estacionamento temporário, já cheio de carros.

Seguiram o Zé para esse campo, estacionando ao lado dele e depois acompanharam-no a pé pela estrada fechada em direcção à povoação.

Pouco depois de entrarem na povoação chegaram ao adro da igreja onde tiveram de parar um pouco. A procissão retornava à igreja naquele momento e era impossível atravessar para o outro lado. Cassandra e Miranda olhavam maravilhadas, nunca tendo presenciado algo assim.

Viam os andores e as estátuas dos santos, carregados em ombros, acompanhados por músicas solenes que eram cantadas pela multidão que acompanhava o desfile.

Quando por fim puderam passar, acabaram de atravessar a povoação e foram dar a um campo onde estava um palco montado, com um espaço largo em frente, ladeado por barraquinhas de comes e bebes.

O cheiro espesso a carne grelhada que tingia o ar serviu para aguçar o apetite das duas, e Miranda fez um sinal a Zé, indicando que ambas tinham fome. Zé fez-lhe sinal para esperar um pouco, enquanto olhava em volta procurando algo, ou alguém. Não vendo o que queria encolheu os ombros e fez-lhes sinal para o seguirem. Levou-as até uma das barraquinhas e indicou-lhes uma mesa, fazendo sinal para esperarem e dirigiu-se ao balcão da barraquinha.

-Vasco, dá aí duas bifanas para as bifas, faz favor. – disse ele.

-Estás muito bem acompanhado, ó Zé. Agora andas a engatar bifas, armado em Zézé Camarinha ou quê? – respondeu o Vasco que olhou bem para elas e acrescentou – Mas também, se andas, tens muito bom gosto.

-Nada disso. Não são companhia para mim. Só vim fazer uma entrega – respondeu o Zé, piscando o olho.

-Olha, azar o teu. Não me as queres entregar a mim?

E riram-se os dois, enquanto Vasco colocava dois pratos de papel com bifanas no balcão.

-Duas bifanas para as bifas especiais. – disse.

-As bifanas ou as bifas.

-Ambas!

Zé voltou à mesa com as bifanas que colocou em frente a elas e voltou atrás para ir buscar duas garrafas de água. Elas ficaram surpreendidas a olhar para as sandes.

-Isto deve ser uma coisa mesmo de cá, não? – Perguntou Cassandra.

-Sim, parece uma sandes de porco.

Agarraram no pão com cuidado, tentando a todo o custo não se sujar com o molho mas lá acabaram por provar as sandes.

Talvez fosse o facto de não comerem há muitas horas, ou talvez o facto de o sabor ser intenso e agradável, mas comeram com deleite, perdendo algum decoro e acabando a chupar os dedos para os limpar dos molhos como viam algumas pessoas a fazer à sua volta, enquanto riam como duas adolescentes.

O Zé acabou por se voltar para o Vasco e perguntar:

-Olha lá, safas-te no inglês?

-Mais ou menos…

-Eu vou indo, mas deixo-as aqui contigo. Tomas conta delas por um bocado? Fora de brincadeiras…

-Sim, claro, vai lá.

-Se entretanto vires por aí o Rob, chama-o. Eu vou ver se o vejo antes de começarem.

-São amigas do Rob?

-Não sei bem, mas pelo menos vêm à procura dele.

-Ok, não te preocupes que eu tomo conta delas.

-Vê lá se não deixas os engraçadinhos meterem-se com elas…

O Zé passou pela mesa e disse-lhes para esperar, fazendo entender que ia procurar Rob. Depois apontou para o Vasco e mostrou-lhes dois polegares para cima. Elas olharam para o Vasco com um sorriso luminoso e acenaram levemente, gesto reciprocado por Vasco que subitamente corou.

2 comentários:

  1. A vida, vivida assim, com alegria e divertimento sem maldade. é uma festa que qualquer mulher gostaria de ter vivido na juventude. Infelizmente, os tempos, no meu tempo, foram outros.; mas quando não conhecemos mais nada gostamos do que temos.
    Vamos ver se o Vasco consegue entreter as jovens até que chegue o Rob, o homem de bela e longa cabeleira. Falar um inglês macarrónico sempre é melhor do que não falar nenhum e o Vasco parece ser um moço desenrascado.
    Boa semana, Gil! :)

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    1. Atão não havera de conseguir? Mas também não vão lá estar assim tanto tempo... ;)

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