Se o caminho já tinha sido demorado à ida, o caminho de volta estava ser lento e penoso. O carro, coberto por uma camada de lama amarelada depois da chuva, enchia-se agora de lama enquanto meandrava pelos caminhos no meio do arvoredo.
-Porque é que o carro ficou todo amarelo com a chuva? – Perguntou ela, curiosa.
-É das poeiras que andam no ar, arrastadas do Sahara pelos ventos. Quando há uma concentração grande acaba por provocar este tempo abafado e quando há trovoadas e chove, cai lama do céu. Fica tudo amarelo, se entretanto não chover outra vez.
-Deve ser uma chatice.
-O pessoal habitua-se. E então, valeu a pena vires?
-Sei que podes pensar que não, mas estranhamente, sim. Foi diferente e até divertido. Os teus amigos são simpáticos. O Tobias disse algumas coisas que me fizeram pensar.
-O Tobias é o nosso velhão. Está quase com sessenta. É o nosso sábio de serviço. A vida não foi fácil para ele, mas mesmo assim ele nunca baixou a cabeça e é sempre uma das pessoas mais bem-dispostas quando o pessoal se junta. É um exemplo para nós.
-Ele mencionou de passagem que era viúvo…
-Sim, ela morreu muito nova. Tinham a miúda com cinco anos, na altura, e ele teve de a criar sozinho. Mas ele fez um excelente trabalho. A filha é médica especialista em Lisboa e é o orgulho dele.
-E ele nunca casou?
-Ele viveu para a filha. Houve alturas em que ele teve dois empregos para poder sustentar os estudos dela. Ele não tinha tempo para ter uma vida. Só quando ela se formou e começou a trabalhar é que ele pôde desacelerar e começar a viver, Mas acho que nunca ninguém o viu sequer tentar chegar-se a alguém.
-Achas que tem medo, por já ter alguma idade?
-Ou isso ou dispensa a chatice.
- A chatice? Achas mesmo?
-Acho. Sabes, um gajo quando chega a uma certa idade quer paz. Sobretudo se está sozinho há bastante tempo. O drama é dispensável. Drama trás chatices. E com mulheres, seja porque motivo for, há sempre um drama. Senão nas próprias vidas, nas vidas dos outros.
-Discordo completamente contigo. Não me revejo minimamente nessa tua afirmação.
-Não? Mal nos conhecemos e já me deste chatices de embarda.
-Então porque é que me aturas?
-Continuo curioso. Afinal ainda não sei qual foi a birra e porque é que andas à procura do teu marido.
Chegaram finalmente a casa de Rob. Ele saiu, abriu o portão para o seu quintal, levando o carro para debaixo de um telheiro, saíram os dois, não ficando ela à espera que ele abrisse a porta e ele acompanhou-a ao portão.
-Se eu voltar, podemos conversar mais um pouco? – perguntou ela, com um ar esperançado.
Ele respirou fundo, como que resignando-se.
-Se eu não tiver nada melhor para fazer, porque não?
Ela sorriu
-Obrigada. Até…
-Vamo-nos vendo. - Disse ele fechando o portão, virando as costas e dirigindo-se ao carro, de onde tirou a guitarra e entrou em casa pela lateral. Ela não tirou os olhos dele, até ele desaparecer. Depois virou-se caminhou em direcção ao seu carro, virou a esquina e…
…arrependeu-se de não ter levantado o tejadilho.
Todo o carro estava amarelo, por fora e por dentro. E o fundo do carro tinha uma altura interessante de água.
De repente estava sozinha bem depois da meia-noite numa rua mal iluminada de uma povoação sem rede de telemóvel. O dia podia correr pior, mas era difícil. Soltou um grito de frustração e deu um pontapé no pneu.
Sem saber o que mais fazer, tocou à campainha de Rob, que demorou um bastante a vir à porta, mas apareceu vestido só com uns calções pelos joelhos e todo molhado.
-Estavas a tomar duche?
-É assim tão evidente? Esqueceste-te de alguma coisa?
-Não, mas tenho um problema e se me pudesses ajudar…
Um sorriso sacana apareceu no canto da boca de Rob.
-Não me digas, pensavas que tinhas um carro mas tens uma banheira…
-Sim… - respondeu ela claramente envergonhada.
-Acções têm consequências. Eu avisei-te…
-Eu sei. Fui estupida. Mas ajudas-me, por favor?
-Uma mulher a admitir que errou? Devia ter gravado o momento para a posteridade. Se eu contar isto a alguém, ninguém vai acreditar. – Disse ele num tom de gozo, enquanto lhe franqueava a porta, afastando-se para ela entrar.
Ela entrou e parou logo a seguir, esperando que ele fechasse a porta e a conduzisse para dentro de casa.
A casa tinha todo o aspecto rustico, típica daquelas partes, com o teto em madeira. Notava-se claramente a enorme grossura das paredes a partir do interior devido à enorme profundidade das janelas. A sala estava esparsamente mobilada com um sofá, uma poltrona, uma mesa de apoio e uma televisão a um canto, sendo dominada por uma enorme lareira.
-Então? – perguntou ele, enquanto fazia menção para ela se sentar no sofá, sentando-se ele na poltrona.
-Não sei. Posso fazer um telefonema para mandar vir um reboque amanhã e arranjar um táxi hoje?
-Podes, mas não te garanto que o táxi não demore bastante tempo. Espera aqui.
Ele levantou-se, saiu da sala e voltou pouco tempo depois com uma embalagem de plástico na mão que abriu, retirou o conteúdo e deu a ela. Ela agarrou e era uma t-shirt enorme, estampada com o nome de uma banda.
-Isso é tamanho XXXL portanto deve dar um bom vestido para ti. Também tens aqui uns chinelos. Devem estar-te grandes, mas é o que se arranja. A casa de banho é ali – apontou ele – e podes ir tomar um duche. Ao cimo das escadas está um quarto pequeno. Podes dormir lá. O colchão não é espectacular, mas há piores. Amanhã é outro dia e escusas de incomodar pessoas a estas horas.
Ela, francamente surpreendida com a atitude dele, agarrou na T-shirt o nos chinelos e dirigiu-se à casa de banho onde tomou um duche o mais rápido possível. Saiu da casa de banho vestida com a t-shirt, o cabelo molhado escorrido e a roupa suja na mão. Ele esperava-a.
-Precisas de alguma coisa? – Perguntou.
-Por acaso não tens um secador de cabelo?
-Não, não uso.
Ela resignou-se e dirigiu-se para a escada que dava para o quarto. Quando chegou ao cimo, voltou-se para ele e disse com toda a sinceridade na sua voz:
-Obrigada.
Ele acenou a cabeça em reconhecimento. Ela entrou no quarto e fechou a porta. Ele entrou no seu.
Bom dia, Cláudio Gil.
ResponderEliminarContinuo a seguir a tua história. Não desisti!
Capítulo a capítulo, torna-se melhor, mais fácil de seguir e, até, de prestar mais atenção aos personagens.
Porém, desculpa-me uma vez mais e não penses que é perseguição ou pretensiosismo da minha parte. Também cometo os meus erros gramaticais e não estou aqui a ler-te para te apontar defeitos.
Bom, como repetiste o erro, suponho que não te zangues comigo.
Podes retirar o acento circunflexo de «pelo» pois em ambas as frases, trata-se da preposição contraída: (por + o = pelo) .
Ex. onde escreves"...uns calções pêlos joelhos ".
Quando escrevo com acento, refiro-me a pêlo do corpo humano ou animal. O que pode tb não estar correcto. :)
Há ainda uma outra 'coisinha' referente ao verbo 'trazer', mas vou deixar passar... :))
Espero que perdoes a minha indelicadeza com a atenuante de te ler atentamente. Como de resto sempre faço.
Um abraço, caro Gil.
Fico feliz que não tenhas desistido :) Pode ser que a história até te surpreenda... Ou não! LOL
EliminarEssa coisa dos Pêlos e pelos... Deixa que te diga que detesto auto-correctores! Mas também admito que não fiz uma correcção muito pormenorizada no texto, por isso é provável que haja não só esses, mas muitos mais espalhados... É chato um gajo escrever sem assento e o word achar que tem de o pôr lá... Detesto mandar SMS's por isso, tb. Já conteceram situações algo caricatas... ;)
Se calhar alguma da confusão que apanhaste para trás é porque as conversas (aparte de algumas frases escritas em inglês) são bilingues quando há alguém que não perceba inglês ou Português pelo meio, daí haver por vezes repetições... Há algumas instâncias disto ao longo da história, mas a maior parte é logo no começo :)
Obrigado por tudo :)