quinta-feira, 8 de fevereiro de 2024

Chuva - XXVI

  

Tinha acabado de chegar quando um helicóptero de uma estação de televisão sobrevoou a baixa altitude, aterrando a escassas dezenas de metros de mim mas longe da multidão que entretanto se juntara perto da falésia.

Ao verem o helicóptero as pessoas precipitaram-se para ele. Estando eu mais perto cheguei primeiro e dirigi-me ao homem que de lá saiu. Tive de gritar por causa do barulho do motor.

“O meu nome é Gabriel Guerra e creio que foram enviados pelo Sr. Rafael Martins para me vir buscar…”

“Sim, sim. Entre e depressa. Temos de levantar antes que aquela gente toda cá chegue.”

Entrei e o helicóptero levantou de imediato, não me dando sequer tempo para pôr o cinto de segurança. As pessoas viram o helicóptero levantar e pareceram entrar em histeria completa.

Não fazia grande sentido tentar falar com o homem. O barulho era quase ensurdecedor. Por isso fiquei calado. Foi ele quem falou comigo.

“Não vamos já para Lisboa. Estamos a sobrevoar as zonas afectadas e a filmar para fazer uma reportagem. Espero que não se importe de nos acompanhar…”

“Não, não me importo. Tudo bem.”

Fez-me o sinal de OK com o polegar e dedicou-se novamente à sua tarefa.

Do ar conseguia aperceber-me da extensão da catástrofe.

“O que é que foi afectado?” perguntei.

O homem fez uma cara séria. “Aqui, na margem sul foi varrida toda a zona costeira até perto de Sines. A costa da Caparica ainda está debaixo de água. A baixa de Sesimbra e de Setúbal estão destruídas. Na margem norte não foi muito diferente. A onda varreu tudo até perto da Nazaré. Entrou pelos estuários do Tejo e do Sado. Inundou boa parte do Ribatejo e partes do Alentejo também. Inundou o vale de Santarém. O Seixal, a Amora, o Barreiro, a Moita, o Montijo, Sacavém, Póvoa de Santa Iria, Alverca e Vila Franca de Xira foram os que sofreram mais.”

O helicóptero seguiu até Setúbal e fui vendo a devastação. Depois voltou a Almada e subiu pela margem sul até ao vale de Santarém, descendo depois pela margem norte.

Apesar do que tinha visto até então, só me comecei a aperceber seriamente do que tinha acontecido a Lisboa quando passamos Sacavém. A zona do parque das nações estava uma desgraça. Quase todos os edifícios tinham danos consideráveis. Os edifícios de escritórios tinham perdido as suas fachadas de vidro, os bares desfeitos. Em muitos sítios apenas restavam estruturas dos edifícios, como por exemplo na gare de Santa Apolónia. Apesar da baixa pombalina ter conseguido resistir quase por inteiro, eram óbvios os estragos provocados pelas águas que tinham subido até acima do Rossio.

As águas tinham forçado a passagem pelo leito dos rios que passam por baixo da cidade desfazendo quase por completo o Martim Moniz, e fazendo levantar ruas e ruir edifícios na parte velha da cidade.

Mas uma das imagens mais impressionantes era, sem dúvida, o enorme paquete que tinha sido arremessado contra os edifícios perto da Rocha Conde de Óbidos.

Mas, apesar das zonas ribeirinhas terem as marcas dos estragos feitos pelas águas, nenhuma parte da cidade tinha sido poupada, sobretudo a zona de Chelas e dos Olivais onde muitos dos prédios se encontravam em ruínas.

Depois de dar uma volta por cima de Lisboa e pelos arredores, o helicóptero acabou por se dirigir para a parte alta da cidade onde aterrou.

À minha espera estava já o Rafael.

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