quinta-feira, 25 de janeiro de 2024

Chuva - VIII

Mas adiante.

Sabes, na semana seguinte não choveu. Ainda assim, nas raras alturas em que dormi tive sempre o cuidado de ligar o gravador, não fosse chover. Claro que tinha uma curiosidade extrema pelo que poderia vir novamente. Não acreditava que o que tinha acontecido fosse um incidente único, obra do acaso. Era demasiado complexo.

Finalmente a chuva veio e eu repeti todo o processo, usei exactamente os mesmos métodos, as mesmas chaves, e lá estava uma mensagem no meio.

 

A remissão deu-se e dar-se-á novamente. Quarto vinte e dois. Passa a palavra.

 

Fiquei novamente a olhar para a mensagem. Mais uma vez o sentido escapava-me por completo. Detesto ficar assim perdido, sem saber o que fazer, sabes. Confunde-me.

Ainda assim, segui a minha rotina, como sempre o fiz.

Nessa manhã, na mesma paragem de autocarro, a mulher que chorava parou a olhar para mim, como que para ter a certeza de que era mesmo eu. Senti o desconforto de ser observado por ela e tentei não ligar. Mas ela, já não chorosa, antes com uma expressão que irradiava boa disposição, alargou ainda mais o sorriso.

“Foi o senhor que me disse aquelas palavras, não foi?”.

Limitei-me a assentir com a cabeça, com o meu desconforto a aumentar por me começar a sentir observado por mais gente.

“Obrigada!” disse ela e com isto agarrou-me nas mãos, que eu tentei libertar de imediato. Não gosto que me toquem.

“Como é que sabia…?”.

Continuei calado. Sabia o quê? Eu não sabia nada. Apenas entreguei uma mensagem.

“Obrigada, obrigada, obrigada…” dizia ela enquanto se tentava chegar mais a mim e as lágrimas lhe começavam a correr pela face, apesar da expressão de felicidade.

Já eu tentava afastar-me sem ser demasiado óbvio. Mas fosse o que fosse que se passava com esta mulher, era obvio que a mensagem que lhe tinha dado tinha tido impacto.

Olhei para ela e percebi. As mensagens não tinham que fazer sentido algum para mim. Apenas tinha de as passar na altura devida.

Posto isto, olhei para ela e disse “A remissão deu-se e dar-se-á novamente. Quarto vinte e dois. Passa a palavra.”

A mulher olhou para mim espantada. Assentiu com a cabeça e afastou-se de imediato, pegando no telemóvel e começou a falar com alguém.

Toda a gente que estava agora na paragem tinha os olhos postos em mim, cheios de curiosidade. Felizmente o meu transporte chegou e eu segui o meu caminho…


Sem comentários:

Enviar um comentário

O QUÊ?!?!? ESCREVE MAIS ALTO QUEU NÂO T'OUVI BEM!