quarta-feira, 22 de julho de 2015

Como ser um garanhão (edição especial para Marrões) - X

X – Esse barco já passou há uns tempos!

Engasguei-me com o café quente de que nem sequer gostava, tossi até às lágrimas e, quando finalmente me controlei lá lhe respondi:
-Xiça! Quando atacas vais directo à jugular!
-Yá! Sobretudo quando se fala do meu assunto preferido: Sexo!
-Julgava que o teu assunto preferido era o teu rabo…
-Posso ter dois, não posso? Além disso estão relacionados!
-Bem visto!
-Bem, mas conta-me cá, tens medo das gajas, é?
-Olha eu,… - disse eu, sentindo um rubor nas faces que denunciava claramente o meu desconforto.
-Deixa-te disso, páh! Faz de conta que eu sou um gajo!
-Não preciso fazer de conta. Já te vejo como um…
Ela olhou para mim irritada.
-E que tal uma chávena de café a ferver na tua pélvis? Hã?
-Não era isso que eu queria dizer… - desculpei-me eu nervosamente, imaginando já o pequeno Alfredo com uma queimadura.
-Mas conta-me lá, como é que alguém chega aos 29 anos sem… Bem, basicamente, sem ter feito nada?
-Bem, eu venho de uma família muito tradicional, muito católica…
-Tou a ver. Toda aquela cena do sexo antes do casamento…
-Ya, e levar com uma vida inteira de me fazerem sentir culpado por aquilo que sentia, dizendo-me que isso me distraia do meu crescimento espiritual, a insistência dos meus pais e avós para que eu entrasse num seminário…
-E entraste?
-Não, não entrei. Não queria ser padre, mesmo!
-Mas olha que há padres que se safam à grande…
-Ya, mas a determinada altura, quando vim para Lisboa estudar, lá me consegui libertar um bocado da religião…
-E diz-me uma coisa, como é que alguém consegue passar por uma universidade e sair vir-gem de lá?
-Olha, é porque tenho a nítida sensação que todas as raparigas por quem me interessei passaram o tempo todo a gozar comigo, a fazerem joguinhos da treta, e acabei por me cansar disso! Aliás para te ser franco, tu és a gaja mais fixe que eu já conheci!
Ela derreteu-se toda quando eu disse isto.
-Achas mesmo? A sério? – mas depois parou a olhar para mim, a sua expressão mudou para uma de incredulidade e reformulou a pergunta num tom de quem tinha alguma dificuldade em acreditar no que eu tinha dito – A sério?!
-Yá!
-Pá, mas eu também me meto contigo e gozo contigo…
-Yá, mas é diferente. Já percebi que é a tua maneira de ser e de brincar e não te levo a mal.
-Ela ficou com uma expressão séria, que me dizia que as minhas palavras, aliás, mais do que as palavras, a maneira como eu me sentia em relação a ela a tinha tocado.
-Pá, mas pelo menos gostas de mulheres, certo?
-Se vires a minha colecção de pornografia lésbica…
-Tu tens uma colecção de pornografia lésbica?
-Pá, ya…
-Tens de me mostrar isso um dia destes. Agora que somos melhores amigos devemos partilhar tudo!
-Mas tu curtes pornografia lésbica?
-E gay e bissexual… O que é que há para não gostar? As histórias são tão kitch! – e depois parou e olhou para mim com um olhar perscrutador – A não ser que tu sejas um daqueles pervertidos que gostam é de porno sem histórias…
-Bem, eu… eu…
-Sim?
-Eu também adoro porno com histórias!
Ela levantou-se, deu a volta à mesa, fez-me levantar, abraçou-me e declarou:
-Vamos ser melhores amigos para sempre! E para comemorar, vou buscar dois doces.
Largou-me e foi ao balcão. Eu sentei-me e continuei a beberricar o café. Ela voltou com duas taças de leite-creme, pôs uma à minha frente, sentou-se e deu uma colherada no seu.
-Olha lá, nos estilos de porno que disseste que gostavas não falaste no hétero…
-Pá, yá, se queres histórias realmente kitch e no porno hétero, mas aquilo não tem grande piada para mim porque anda tudo à volta de fazer o gajo vir-se. Aquilo é umas lambidelas, umas cavalgadas pela frente, depois por trás e acaba o gajo a deixar-lhe a cara toda pegajosa e pronto. E, acredita, isso é mesmo um granda corta-tesão!
-A sério? Eu julgava que as gajas curtiam isso…
Ela olha para mim com um olhar de “Achas mesmo?”, mete os dedos no leite-creme, levanta a mão até perto da minha cara, sacode-a e salpica-me todo de leite creme.
-Agora imagina isso, mas ainda mais peganhento, mais quente, mais salgado e a fazer-te arder a vista!
Fiquei a olhar para ela! Realmente nunca tinha pensado nas coisas assim!
-Pá, e os orgasmos simultâneos?
-Boa sorte com isso!
-E os pelos púbicos depilados?
-Já depilaste os teus? Faz uma comichão…
-E a vontade de fazer anal?
-Bem, há algumas que até gostam demais… Mas na grande maioria é só uma data de dores e um andar esquisito no dia a seguir…
O castelo das ilusões que tinha construído desde a minha adolescência desmoronava-se assim, repentinamente! Sentia-me profundamente desiludido, enganado até! Finalmente admiti, tanto para ela como para mim:
-Pois! Estou a ver que a minha dependência exclusiva da pornografia me fez criar expectativas irrealistas em relação ao sexo!
-Ya! – Corroborou ela – Mesmo! Mas tens de ver a coisa pelo lado positivo…
-Que é…?
-Agora estou aqui eu, e eu, meu querido amigo, vou-te ajudar a arranjares gajas. Aliás, não tarda nada até hás-de andar aborrecido de tanta rata!
-Tu vais-me ajudar?!
-Sim, claro!
-Mas porquê?
-Porquê? Ora essa! Somos amigos, tu precisas de ajuda, eu ajudo! Simples!
-Mas, pá, nunca ninguém me quis ajudar… Não és a primeira pessoa a quem eu falo disto, mas nunca ninguém se quis envolver, todos diziam que com o tempo aconteceria naturalmente…
-Olha, pá, esse barco já passou há uns tempos!
-Mas eu não acredito que mereça ajuda… - estava tão comovido que as lágrimas me subiam aos olhos.
-Rapaz, se eu disse que ajudo, é porque ajudo mesmo. Garanto-te que não vais chegar virgem aos 30. Além disso eu sou perita em “acasalar” pessoal e sempre me dei bem, excepto uma vez, mas essa também não conta para nada!
Vim a saber mais tarde que essa tentativa falhada tinha sido nem mais nem menos que uma maquinação para transformar dois héteros em bissexuais para irem para a cama com ela, mas a coisa correu mal… Muito mal!
-Fizeste anos há pouco tempo, não foi? Isso ajuda-nos e dá-nos mais tempo. Mas vais ver que não tarda nada vais andar a nadar em ratas!
Não me consegui conter:
-Oh, Cris, obrigado! Eu… eu… - não consegui conter a emoção. As lagrimas começaram a correr livremente!
-Freddy, tas a chorar? Desculpa! – Ela levantou-se e deu a volta à mesa – Não te queria perturbar assim…
-Não é isso! – Respondi eu aos soluços e depois agarrei-me a ela, abracei-a e explodi – Se soubesses há quanto tempo eu queria ouvir essas palavras…

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