segunda-feira, 11 de março de 2024

Cnscientização - X

  

O carro parou em frente a um concessionário da Mercedes. Andreia estava lívida dos sustos que apanhara no Chevrolet Corvette. Pelo caminho ainda tinha perguntado a César:

- Mas o que é que o faz gostar assim tanto deste carro?

Para ela era apenas um carro velho. Bonito mas velho, sem o conforto dos carros actuais, sem vidros eléctricos, sequer, bastante instável e notava a luta que César fazia para manter as rodas coladas ao chão. A resposta surpreendeu-a:

- O facto de estar constantemente a tentar matar-me.

- E isso é assim tão interessante?

- É. Faz-me sentir vivo. É uma espécie de desporto radical. Há quem se atire de pára-quedas de uma torre, quem salte de uma ponte atado por um elástico, quem escale montanhas, quem se monte em cavalos ou touros bravos… Eu conduzo um Corvette. É quase a mesma coisa, mas sai mais caro…

Pela primeira vez ela viu-o a sorrir abertamente.

Agora que tinham chegado, saiam do carro e ela percebia o gosto que ele tinha nele.

Mesmo os vendedores da Mercedes pareciam embasbacados a olhar para aquela raridade, apesar de estarem rodeados por carros de luxo em exposição.

Não obstante, o facto é que quando entraram não houve grande atenção por parte dos vendedores. Andreia, simples como estava, não chamava grande atenção e César estava completamente à vontade, apenas vestido com uma t-shirt, umas calças de ganga e uns sapatos, não estando, de modo nenhum, ostentativo. O facto de ali chegarem num carro com trinta anos, fosse que carro fosse, também não ajudava por aí além. Só depois de alguns minutos de andarem a ver os carros em exposição um vendedor se aproximou.

- Bom dia. Posso ajudá-los?

- De facto pode. – Respondeu César – Estou interessado numa viatura comercial, com sete lugares e espaço para carga.

- Bem, para isso terá de descer ao piso inferior. Temos lá as Vito em exposição…

- OK. Acompanha-nos, por favor?

- Não, terá de se dirigir ao colega de lá. São departamentos diferentes…

- Compreendo. Diga-me, aqui é como nos “States”? Ganham uma comissão sobre cada carro vendido?

- Bem, sim…

- Ok. Muito bem, eu falarei com o seu colega.

O vendedor indicou-lhes o caminho do elevador e voltou para junto dos outros colegas que aguardavam clientes.

Assim que entraram no elevador César voltou-se para a Andreia e comentou:

- Acho que aquele tipo se vai arrepender…

Ela não percebeu bem o que ele queria dizer, por isso manteve-se calada. No piso inferior procuraram a secção de veículos comerciais e encontraram um vendedor com uma atitude muito menos elitista. Até a maneira como estava vestido era mais simples e mais desportista. César disse-lhe o que queria, ele mostrou-lhes algumas variações e ficou surpreendido quando César lhe perguntou.

- Quando é que tenho o carro na mão?

- Bem, a papelada demora alguns dias, mas desde que seja um carro que tenhamos em Stock, não demorará muito…

- E se eu quiser ter o carro entregue em minha casa amanhã?

- Bem, é quase impossível…

- É o que é que é necessário para que não seja impossível?

- Mas tem assim tanta urgência?

- Tenho.

- Dê-me um minuto…

O vendedor afastou-se, fez uns quantos telefonemas e voltou alguns minutos depois.

- Bem, telefonei a algumas pessoas conhecidas e creio que lhe consigo entregar o carro ou amanhã ou, o mais tardar, depois de amanhã.

- Isso tem algum custo adicional?

- Não, de todo. É só porque se de facto tem urgência… César olhou para ele e sorriu.

- Bem, fico contente que assim seja. Gosto de si como vendedor.

- Obrigado.

- Sabe, além deste carro, quero ver mais.

- Mais?

- Sim. Quais são os vossos topos de gama?

O vendedor olhou para ele, um bocado desconsolado.

- Isso é com os meus colegas do piso de cima…

- Pois, mas foram eles que me mandaram para si. Já fez esta venda hoje e está a atender-me e vai continuar porque eu não quero falar com mais ninguém. Portanto fale com quem quiser, mas vamos subir e ver o que têm para entrega.

O vendedor assentiu, fez um telefonema interno onde explicou a situação e depois levantou-se e disse-lhes:

- Podem acompanhar-me, por favor?

Voltaram a entrar no elevador e subiram ao salão de exposição. De imediato, apareceu um tipo com um fato de corte impecável que veio direito a eles. O vendedor apresentou-o.

- Este senhor é o nosso gerente, o Sr. António Teles. A D. Andreia,…

- o tipo cumprimentou-a com um aperto de mão delicado – … e o Sr. César Caetano.

- Muito prazer. Então querem ver viaturas topo de gama?

- Sim. – Respondeu César.

- Muito bem, podem acompanhar-me. Podes ir João. – Disse ao vendedor que os tinha acompanhado.

- Não, não pode. – Atalhou César.

- Desculpe?

- Não. Estou a ser atendido por este senhor e quero continuar a ser atendido por ele.

- Bem, mas estamos a falar de secções distintas. São regras…

- Não há regra que exista que não possa ser quebrada.

- Mas entenda que…

- Entendo que a comissão é para quem faz a venda. Já estava a tratar com este senhor e quero continuar. Se não for permitido, não há problemas. Há mais carros no mundo.

O homem ficou parado perante a inflexibilidade de César. Andreia mantinha-se silenciosa a observar tudo e João, o vendedor, não sabia como reagir. Ao fim de um silêncio momentâneo o gerente lá cedeu.

- Muito bem! João, acompanha o senhor. Se precisares de ajuda diz. João assentiu e voltou-se para César.

- Muito bem, o que tinha em mente? Cesar voltou-se para Andreia:

- Ajeita-se a conduzir um carro grande?

- Não sei muito bem…

- Habitua-se! – E virou-se para o vendedor – Qual é o topo de gama?

- Em que tipo de carro?

- Limousine.

- Temos o Classe S 63 AMG!

- E têm algum em exposição?

O vendedor levou-os ao carro. Era, sem dúvida, imponente.

- Isto é carro para que preço?

- O preço base anda à volta dos cento e noventa e seis mil euros.

- E este que aqui está?

- Este tem já uns quantos extras. Dê-me um instante que eu vou verificar. O homem afastou-se por um bocado e voltou com o preço.

- Este está à venda por duzentos e oito mil euros.

- Consegue-o entregar amanhã também?

- Sim, creio que sim.

- Muito bem. É meu.

O vendedor estava atónito a olhar para ele, sem saber o que dizer. Mas pior ainda ficou quando o ouviu dizer:

- E agora vamos ver um carro para mim. Reparei naquele desportivo que estava ali em exposição…

- É um SLS AMG roadster.

- E está à venda por quanto?

- Aquele veio só para exposição, mesmo. Acho que é dos poucos que há no país…

- Pormenores à parte, quanto?

- Vou-lhe pedir mais um minuto.

- Com certeza.

Minutos depois o homem voltava com a cara quase lívida.

- Já tenho o preço. Trezentos e quatro mil setecentos e sessenta e nove euros e quarenta e quatro cêntimos.

César olhou para o carro durante algum tempo. Depois encarou o vendedor e disse simplesmente.

- Vá tratar da papelada. Quero que mo entregue amanhã também. O Stingray não foi feito para as estradas de Portugal. Já agora, está a ver aquele seu colega? – Perguntou apontando para o vendedor que os tinha recebido quando chegaram.

- Sim.

- Agradeça-lhe. E se tiver algum problema com as comissões das vendas, avise-me. Afinal, tanto quanto sei, tenho duas semanas para poder devolver os carros, portanto…

O vendedor encarou-o com uma expressão de gratidão imensa no rosto. Apertou-lhe a mão, comovido, quase com lágrimas nos olhos.

- Obrigado. – Limitou-se a dizer.

- Trate sempre bem os seus clientes. Afinal, nunca se sabe com quem se está a lidar.

Vinte minutos depois César e Andreia saiam do concessionário com os carros pagos e todos os papéis tratados. Andreia não sabia o que pensar…


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