quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

Lilith - III - O mito de Lilith

Onze da manhã.

Acordei de um sono pesado, entrecortado com visões de paraísos perdidos, de presenças divinas, de tentações.

Pensei na noite anterior, como um sonho absolutamente estranho, e decidi que mudaria a marca de whisky que tinha andado a beber. Claramente, esta não me favorecia.

Levantei-me com uma dor de cabeça do tamanho do mundo, sinal evidente de ressaca, mas, por outro lado, o resto do meu corpo não se sentia como tal. Estava, inclusivamente, com fome. Muita fome.

Resolvi comer qualquer coisa, levantei-me, dirigi-me à cozinha e, ao passar na sala, que ficava no caminho, notei o perfume adocicado que pairava ainda no ar, suave mas pleno de insistência. A minha dor de cabeça passou de imediato, como se aquele perfume contivesse o remédio para os meus males.

Em cima da mesa da sala a Bíblia que ela tinha ido buscar à estante e que me dera para ler. Afinal não fora um sonho. Ela tinha estado ali, presente, fosse ela quem fosse.

Todo o meu ser racional se recusava a acreditar que tinha estado a falar com uma personagem mitológica, pelo menos nas suas próprias palavras. Não deixava, no entanto, de ser fascinante.

Decidi que iria procurar referências a Lilith. Comi, agarrei no carro e estava em Lisboa pouco mais de uma hora depois. Fui a casa buscar o portátil e fui em seguida para a Baixa, em busca de alguma livraria que tivesse obras relacionadas com esoterismo e onde pudesse encontrar esta personagem. A meio da tarde já me dirigia novamente para o meu isolamento, com meia dúzia de livros debaixo do braço e um portátil com internet móvel.

A semana seguinte foi passada a ler com afinco acerca de Lilith, e descobri que era quase sempre associada a demónios e súcubos. Era a tentadora, um demónio vingativo que andava pelo mundo a matar crianças no berço e ainda no ventre das mães, que tentava homens jovens que dormiam sozinhos para poder dar à luz criaturas demoníacas, e mais uma série de coisas, nenhuma delas muito abonatória. Era uma figura transversal a quase todas as civilizações, havendo representações suas na Suméria, no Egipto, na Grécia e por consequência em Roma, e ao longo da Idade Média, sendo que era costume colocar amuletos por cima das portas ou nas paredes dos quartos das crianças com a inscrição «Lilith – abi», que quer dizer «Lilith – vai-te para as proteger da morte súbita. Alguns estudiosos consideravam mesmo que esta expressão é a origem da palavra inglesa Lullaby, que quer dizer canção de embalar, sendo que originalmente se referiria a uma evocação ou oração cantada para proteger as crianças durante o sono. Por outro lado, começava nos dias de hoje a ser vista como uma imagem da independência feminina e da procura da igualdade entre os sexos. Existiam inclusivamente revistas com o seu nome.

A minha cabeça enchia-se de perguntas sem resposta.

1 comentário:

O QUÊ?!?!? ESCREVE MAIS ALTO QUEU NÂO T'OUVI BEM!