sexta-feira, 17 de junho de 2016

Há uns anos atrás...

...uma chefe minha, depois de me ter dado um trabalho que normalmente levava um mês a fazer e que tinha ficado pronto em três dias, olhou para mim espantada e perguntou-me:
-Mas como é que você consegue despachar tanta coisa em tão pouco tempo?
Eu respondi de forma sincera:
-Sou preguiçoso.
Ela ficou a olhar para mim séria e estática.
-Como assim?
-Simples. Se sou preguiçoso e tenho uma quantidade absurda de trabalho para fazer, tenho de arranjar estratégias para fazer o menos possível sem deixar de fazer o que tenho para fazer. Isso quer dizer que passo a maior parte do tempo a arranjar estratégias para fazer o menos possível, o que me leva a arranjar soluções. Essas soluções, quando funcionam e são bem aplicadas levam a que o trabalho se faça praticamente sozinho com um mínimo de intervenção da minha parte.
Ela ficou pensativa e acabou por dizer:
-Mas isso é excelente...
-Por um lado! Por outro apenas quer dizer que me vão dar ainda mais trabalho o que implica perder tempo a arranjar novas estratégias! Acaba por ser um ciclo vicioso. Mas pior ainda porque quando alguma das minhas tarefas é dada a outra pessoa a coisa dá para o torto...
-Como assim?
-Imagine que dá este trabalho a outra pessoa. Será razoável pensar que esperará que a pessoa despache isto em três dias...
-Sim.
-Pois, mas a outra pessoa vai demorar um mês.
-Acha mesmo?
-Não era o que demorava a minha colega?
-Pois, era!
-Aí está! É que quem vier atrás não será tão preguiçoso como eu, ou então será mais preguiçoso que eu!
-Como assim!
-Sendo menos preguiçoso apenas executa o trabalho. O resultado é demorar um mês.
-E sendo mais?
-Será preguiçoso demais para desenvolver estratégias que permitam simplificar o trabalho, vai andar três semanas a procrastinar e uma semana completamente em stress para conseguir fazer o trabalho num mês!
-Está a querer dizer-me que para se ser eficiente é preciso ter a dose certa de preguiça?
-Exacto!
-Olhe, nunca tinha pensado nisso...

E vêm esta história a propósito de quê?

"(...) ...o progresso não vem dos madrugadores... O progresso é conseguido pelos homens preguiçosos que procuram maneiras mais fáceis de fazer as coisas. (...)"

in "Amor sem limites (as muitas vidas de Lazarus Long)" - Robert A. Heinlein

15 comentários:

  1. Adorei! Por aqui, Mario Quintana já considerava a preguiça como mãe do progresso, pois, os homens inventaram a roda, justamente, por preguiça de caminhar ;)

    Beijão!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. E tinha razão! Se não fossem os preguiçosos, o que seria deste mundo?

      Bem-vinda

      :)

      Eliminar
  2. E eu ainda acrescento o perfecionismo como característica do preguiçoso, é essencial que a tarefa fique bem feita logo à 1.ª, para não se ter o trabalho de corrigir as asneiras, posteriormente ;))) Fala uma preguiçosa do caraças :P

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Completamente de acordo. Por vezes é preciso perder algum tempo a aperfeiçoar os processos, sem fazer absolutamente nada do trabalho!
      Depois é só entrar em modo de cruzeiro e deixar que o trabalho se faça sozinho...

      Claro que às vezes isto é de todo impossível, mas na maior parte das vezes funciona, mesmo contra todos os prognósticos dos trabalhadores esforçados!

      :)

      Eliminar
  3. Gostava de ver uma jogadora de vólei de praia ... preguiçosa :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Ora...

      Pois eu ficava-me só pela primeira parte da frase. A segunda é opcional!
      Aliás, como a bola, a rede ou o campo, para ser franco! Já deves ter percebido que não sou fã de vólei de praia masculino, o que poderá eventualmente dar a entender que não é bem o vólei o que interessa...

      ...desporto faz-se por gosto portanto isso é uma contradição em termos...
      ...mas ainda assim, eventualmente, uma preguiçosa o suficiente pode maximizar os seus movimentos e quiçá os da equipa...

      (uma amiga, aqui há uns tempos, contou-me que há um personagem num livro qualquer do Pedro Chagas Freitas que detesta futebol mas é o melhor jogador do mundo! O principio é o mesmo. Se não gostas de fazer uma coisa, tenta fazer com o mínimo esforço possível e da maneira mais eficiente para te livrares da coisa o mais rápido possível! Já se gostas de uma tarefa, dificilmente vais fazê-la evoluir em termos de eficiência...)

      :)

      Eliminar
    2. Resumindo: Os preguiçosos fartam-se de trabalhar para depois poderem fazer menos ahahahah

      Boa tarde Sô Gil

      Eliminar
  4. Mas isso é lindo!
    Dava uma tese antropológica, um tratado de psicologia invertida, qualquer coisa de muito inovador...
    :)
    Agora, deixa-me que te dê uma opinião: tu és tudo menos preguiçoso. E ainda és organizadíssimo!
    A chefe que te aumente, isso sim :)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não, pá, sou mesmo preguiçoso!
      Para teres uma ideia, estou à meses a construir uma guitarra...
      ...e basicamente, além da escala, que está pronta, tenho passado imenso tempo a construir coisas que apenas vão facilitar a tarefa de construir a guitarra, mas não a guitarra em si!

      Com um martelo e um formão já a tinha feito toda, de não fosse preguiçoso...

      LOL

      (a única vantagem é que se tiver de fazer mais alguma, já tenho tudo preparado é faz-se em dois ou três dias...)

      A minha chefe não me pode aumentar...

      :)

      Eliminar
  5. O que eu sei é que isso se traduz em cada vez mais trabalho, uma vez que se faz tudo num instante e menos tempo para preguiçar. Ao fim de um certo tempo, é de loucos e se se resolve retroceder, parece-se lento e incompetente...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Depende...

      ...como aparentemente mudo de chefe com alguma frequência, não é assim tão complicado retroceder...

      :)

      Eliminar
  6. Finalmente compreendi, porque o mundo está no caos em que se encontra... excesso de eficiência... e falta dessa preguiça.... das boas...
    abraço
    Ana

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Todos tem de ser os melhores a executar a tarefa que têm à frente, conforme lhes foi ensinada...
      ...e podem até sê-lo, porque mecanizando algo e repetindo à exaustão é a melhor maneira de nos tornarmos os melhores em algo...
      ...e não pensar e não questionar, também ajuda a fazer o melhor possível daquela maneira!
      Mas isso não quer dizer que não hája outras, melhores e mais práticas!
      Estamos tão especializados que perdemos a criatividade!

      :)

      Eliminar
  7. Gostei, sim senhor, dessa filosofia de vida. Por entre os destroços duma suposta eficiência, ainda há gente que pensa pela sua cabeça. A grande questão é... ter um chefe que entenda isso.
    (Na verdade, o interessante seria saber como funcionam as coisas para lá dessa suposta preguiça, com o autor a navegar nas suas águas...)

    Abraço

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Sabes, eu tive a minha instrução em PC´s numa altura em que eram maquinas extremamente complicadas! Embora linguagens como o Basic dessem para aldrabar muita coisa, outras eram lineares e um erro numa linha de programação dava cabo de tudo! Isto ensinou-me a estruturar o pensamento e a procurar sempre o caminho mais eficiente entre dois pontos, o que não quer dizer que seja o mais curto!
      Foi uma lição tão importante que a apliquei a tudo na vida.
      Dou-te um exemplo:
      -quando fazia atendimento ao público tinha exactamente as mesmas funções que todos os meus colegas! Os meus colegas eram corteses e preocupados. Conheciam as pessoas, atendiam-nas, perguntavam-lhes pela família, pela vida...
      ...e os seus atendimentos eram sempre complicados, sempre com imensa gente à espera!
      Ora eu reparei que na grande maioria dos casos (claro que havia excepções, mas eram apenas uns 5% do total de atendimentos), sem qualquer tipo de conversa acerca de assuntos não relevantes demorava cerca de 20 segundos para atender uma pessoa.
      Então, comecei a entrar de manhã, atendia cerca de 100 pessoas em uma hora, deixava os casos complicados para quando teria inevitavelmente de lidar com eles, mandava embora quem era para ir embora, quem era para ficar ficava, tratava dos outros 5% de casos que não dependessem de mais alguém estar presente, ligava a televisão e depois passava o resto do dia na conversa com as pessoas que estavam na sala e tratava dos atendimentos que iam aparecendo a conta-gotas ao longo do dia!
      Ou seja, descobri maneira de trabalhar arduamente uma hora mas passar o resto do tempo relaxado e a manter a sala com o melhor ambiente possível.
      Os meus colegas nunca conseguiram abarcar bem o conceito de como eu fazia as coisas, mas admiravam-se, porque fosse eu para onde fosse, as salas estavam sempre sossegadas e com enormes tertúlias, onde se falava dos assuntos mais variados...
      ...já eles matavam-se atrabalhar e as salas estavam sempre uma bagunça...

      Quando se muda um pouco a mentalidade e o ponto de vista, pode-se mudar o mundo! E a maneira como vemos as coisas devem depender mais das circunstâncias do que das regras. As regras, óbviamente, são para cumprir...
      ...mas há sempre mais que uma maneira de matar pulgas!

      :)

      Eliminar

O QUÊ?!?!? ESCREVE MAIS ALTO QUEU NÂO T'OUVI BEM!