Cada cidadão, reconhecido como tal, tinha direito, quando chegava aos dezoito anos, a duas cartas. Duas cartas com objectivos distintos, uma completamente azul e outra encarnada.
A partir desse dia cada cidadão faria o que entendesse com essas cartas, que, independentemente de tudo, eram pessoais e intransmissíveis. No entanto, podiam ser penhoradas a terceiros, sem que a propriedade fosse alguma vez posta em causa. Em qualquer altura, fosse por que motivo fosse, o proprietário da carta podia livrá-la da penhora.
Os motivos que poderiam levar alguém a penhorar as cartas diziam respeito apenas ao próprio. Desde interesses pessoais a ideológicos. Ou podia, inclusivamente, escolher nunca as penhorar, se bem que não era fácil conseguir ficar com elas, simplesmente.
Quando alguém recebia o penhor de uma das cartas, fosse a troco do que fosse, essa carta passava a contar como dele. Quanto mais cartas alguém tiver, mais peso representa na sociedade. No entanto, o possuidor das cartas não tem qualquer obrigação de espelhar as ideias do detentor original. Apenas as suas. Mas, uma vez que a qualquer altura a penhora pode ser levantada, convinha manter satisfeitos os portadores originais.
Claro que o mesmo se passava em escalões mais acima. O portador de uma vasta quantidade de cartas poderia penhorá-las, independentemente da vontade dos portadores originais, a uma terceira pessoa, e assim por diante.
A carta azul representava uma comuna restrita, local. A encarnada era mais abrangente, contando a nível da nação. Em qualquer altura, os dez cidadãos com maior número de cartas tinham direito a sentar-se num concelho onde eram tomadas as decisões executivas.
Claro que, devido à organização das penhoras, havia constantemente cartas a mudar de filiação, pelo que os dez eram sempre algo de variável, consoante as aspirações legítimas dos proprietários das cartas.
Uma vez que a contagem das cartas era anunciada semanalmente, sempre na véspera da reunião, podia haver sempre mudanças na constituição do conselho dos dez, embora isso fosse, de alguma forma, raro. Mas mesmo quando havia mudanças, estavam restringidas a uma elite que conseguia chegar e manter-se no topo da hierarquia.
Os membros do concelho não dispunham de igualdade. Somadas todas as cartas detidas pelos dez, eram achadas as percentagens que cabiam a cada um, e com base nessas percentagens eram-lhes atribuídas fichas que valiam votos nas decisões. No conselho dos dez havia sempre também uma décima primeira pessoa, o decimo primeiro com mais votos, que era o mediador.
Cada um dos dez trazia propostas à mesa que estavam de acordo com os seus pontos de vista, fossem eles pessoais ou questões que apareciam de acordos feitos para obter o numero de cartas necessário. Essas questões eram postas em cima da mesa e analisadas de uma semana para a outra, altura em que seriam votadas, caso fossem aceites, ainda que quem as tivesse apresentado não estivesse na mesa na semana a seguir. As reuniões abriam sempre com a votação das propostas da semana anterior e, só em seguida, com a apresentação das propostas para a semana seguinte e a votação de aceitação.
As votações eram feitas levando as fichas que cada um detinha para um determinado ponto da mesa em que havia dez quadrados contíguos e exíguos. As fichas de cada um tinham de ser dispostas dentro do quadrado. Se alguma das fichas, por azar, caísse para um dos quadrados contíguos, esse voto contaria segundo a vontade do proprietário desse quadrado. Finda a votação, as fichas seriam devolvidas ao respectivo dono.
E, é neste clima que começa a nossa história…
Hum! Parece-me que vem mais um "filho" por aí ;)
ResponderEliminarBeijo Molhado,
ResponderEliminarOu não...
Sinceramente não sei! Tenho cada vez menos paciência para pregar aos peixes...
(ainda que haja peixes magníficos que até me dão ouvidos)
...e quando não se vê um sentido concreto para fazer algo...
...procrastina-se!
:)