quinta-feira, 18 de junho de 2015

Chego ao balcão e fico atónito.

Enquanto espero uma das três empregadas confere qualquer coisa na caixa registadora e as outras falam uma com a outra.


Espero.


Demora quase uma eternidade até que elas deixam de falar e quando finalmente uma parece que me vai dar atenção a que estava na caixa volta-se para ela e diz:
-Vou ao armazém conferir umas coisas e volto já.
A que me ia dar atenção é distraída, a atenção desviada, e eu continuo ali, atónito.
Fixo o olhar numa delas, com o sobrolho meio levantado, até que, finalmente, incomodada me dá atenção.
-Boa tarde. – Diz-me.
-Boa tarde. Quero um café cheio em chávena fria.
Um tipo qualquer chega ao balcão, num lado que é perpendicular a mim e pede, sem cerimónias, uma imperial.
O meu café chega, finalmente, dou um trago e deixo o amargo envolver-me a língua, fecho os olhos e sinto o  deleite por instantes.
O tipo ao meu lado dá um trago ruidoso na imperial. Pousa o copo em cima do balcão e começa.
-Quando eu cheguei a Lisboa era só um catraio, pá.
Perguntei-me se falaria para mim. Não. Nem para nenhuma das empregadas…
…e não havia aqui mais ninguém.
-Isto era tudo tão diferente… - continuou ele – Por exemplo, não estavam ali aquelas palmeiras que apareceram ali de um dia para o outro.
Continuou o seu discurso para ninguém. Tentei não lhe ligar, mas já foi impossível saborear o café da mesma  maneira. Assim que acabei o café pus uma moeda de cinquenta e uma de dez cêntimos em cima do balcão branco e afastei-te.
O homem lá continuou o seu discurso, que começou a subir de tom, no meio dos golos de imperial.
Entrei sala de embarque para o barco. Fiquei de pé junto da porta. Ao pé de mim dois miúdos a quererem ser mais do que eram, a falar de gajas e a mostrarem fotos nos respectivos telemóveis das ditas.
Nisto o homem entra e continua o seu discurso.
-E se eu quiser gastar cinquenta ou cem euros? Qual é o problema? Não tenho ninguém nem satisfações a dar… - Dizia – Posso bem gastá-los.
Os putos notaram e interromperam as suas considerações.
-Heina, topa lá o cota?
-He, he! Tá completamente marado…
O homem continuava.
-A culpa é dessa corja de bandidos. Ladrões. Porque é que o vinte cinco de Abril não pode ser amanhã?
Os miúdos gozavam. Eu percebi-o.
Tão intempestivamente como entrou, o homem saiu e deixou a sala sem ter onde se focar.
A indiferença voltou.

Ninguém o percebeu…

…a não ser eu!

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