quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Cavanna

Nos Idos de 1986 foi dada à prensa, pela mão da D. Quixote, a 1ª e que eu saiba única edição em Português de um livro com um Título sui-géneris:

As sagradas escrituras - as aventuras de Deus e do menino Jesus

Li pela primeira vez este livro pelas mãos de um amigo que o têm (é uma raridade) enquanto ia numa carrinha carregada de material e pessoal para um concerto a cerca de 20 Km de Beja. Ou por outra, não consegui ler, porque a cada meia página escangalhava-me a rir tendo os outros todos a perguntar-me porque e tinha de voltar atrás e lia alto a passagem que me tinha feito rir...

...o resultado é que quem passasse por nós na estrada devia pensar que aquilo era uma carrinha cheia de malucos que tinham andado a fumar umas cenas...
...o que não anda longe da verdade, mas não era o caso naquele momento!

Não descansei enquanto não encontrei o livro, pelo qual paguei uma quantia nada modesta pela compra e envio de uma pequena livraria em Minas Gerais, no Brasil, da edição Portuguesa...

E chegou-me às mãos um livro novo com 28 anos!

E, apesar do preço que paguei por aquele que era provavelmente o último exemplar novo da edição Portuguesa, valeu a pena...

...e nem vos digo porque é que valeu a pena...

...mas mostro um bocadinho...

(e aqui para nós, se Deus têm sentido de humor (e deve ter - basta olhar para o ornitorrinco) deve ter-se rido às bandeiras despregadas com este livro!)

«No princípio, Deus criou o Céu e a Terra. A Terra era informe e vazia e as trevas cobriam a face dos abismos. Não era um sucesso… Deus viu isso e desejou que aquilo nunca tivesse existido, mas isso Ele já não podia fazer por isso o melhor era aceitar o Seu trabalho.

Deus disse: «faça-se luz», e a luz fez-se.

Deus viu que a luz era boa e Ele rejubilou-se no Seu coração.

Era uma sorte. Ela poderia igualmente ter sido má. Vocês sabem como é, quando se cria qualquer coisa, às vezes sai bem, às vezes sai mal. (…)

Deus disse para consigo que, se ele tivesse sabido, teria começado por criar a luz.

O que prova que Ele tinha muito que aprender.

Ora, Deus, sendo omnisciente, não pode aprender nada que não saiba já.

A não ser que, naturalmente, ele tenha decidido no Seu todo-poder não saber esta ou aquela coisa, quer dizer, não ser mais omnisciente.

Quer dizer, não ser mais Deus.

Porque Deus pode tudo, mesmo deixar de ser Deus. Mesmo suprimir-se a si próprio.

O que é um pouco embaraçoso, porque então Deus não é eterno.

Porque se Ele é eterno não pode morrer, mesmo que assim o decida e, então, ele não é todo-poderoso.

Deus tem portanto a escolha ou é Eterno ou é Todo-Poderoso.

E em ambos os casos: não é Deus.

Este é um problema insolúvel.

Um problema insolúvel é um problema que não tem solução. Se ele não tem solução ninguém o pode resolver, nem mesmo Deus.

Por conseguinte, um problema insolúvel é mais forte que Deus.

Mas os problemas insolúveis, como todas as coisas, foram criados por Deus. (Contudo Ele não se lembrava de ter criado essa…) A criatura não pode estar acima do seu Criador.

Tudo isto faz pensar.

Foi precisamente à força de tanto pensar em tais coisas desde a eternidade da duração que Deus, para mudar as suas próprias ideias, decidiu criar.

Mas quanto mais Ele criava mais isso Lhe dava que pensar.

Hum…

Então, Deus interrogou-se se seria mesmo Deus.

Mas se Deus não é Deus, quem é que é Deus?

Ham? Ham?

Não saio deste ponto.

Deus viu que qualquer coisa não ia bem.

Felizmente Deus viu que tinha criado a Contradição, e voltou a serenar o Seu coração.

Porque, graças à Contradição, Ele podia então ser e não ser ao mesmo tempo (…).

Portanto, Ele não tinha nenhuma razão para Se preocupar.

Bastava-lhe não pensar mais no assunto.

E deixar mesmo de pensar.

Porque o pensamento não é bom.

Quando começamos a pensar nunca sabemos onde é que vamos parar. Quando Deus começa a pensar o Seu pensamento arrisca-se a dar com isto, o que é muito desagradável: que Ele não existe.

Ora, Deus quer existir.

Ponham-se no seu lugar.

Se Deus tivesse de deixar de existir cada vez que a Sua existência se torna logicamente absurda, não haveria religião possível.

E, neste vale de lágrimas, as criaturas não saberiam o que haviam de fazer domingo de manhã antes da hora do aperitivo.

E isso seria triste.

Felizmente Deus não pensa.

Graças a Deus!»

2 comentários:

  1. Abristes-me o apetite para ler estas Sagradas Escrituras :)...
    ...mas pelo que vejo já não se encontra à venda!

    Vou por um anuncio no OLX...pode ser que haja alguém que se queira desfazer dele :))
    Beijo

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  2. Beijo Molhado,

    Pois digo-te: Se o encontrares nem sabes o que te espera...

    (é melhor que tenhas os abdominais em forma, senão vão doer de tanta gargalhada)

    :)

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