quarta-feira, 11 de março de 2015

Admirável mundo novo



Ontem resolvi finalmente pegar num livro que já estou para ler há alguns anos.
“Admirável mundo novo” de Aldous Huxley.
Confesso, apenas li o prefácio, escrito pelo próprio umas décadas depois da obra original ter sido editada. E assustei-me com a clarividência deste homem.
Tal como George Orwell, ele preconiza a sociedade futura será totalitária, avançando que todos os indícios estavam já, naquela altura a apontar para isso.
Mas, ao contrário de George Orwell, ele afirma que esta sociedade apenas poderá existir se a elite que controla a sociedade conseguir manter a população não só na escravidão, mas felizes  com essa mesma escravidão (o que não implica ser feliz na vida) e dispostos a defender a sua servidão.

“(…)Não há nenhuma razão, bem entendido, para que os novos totalitarismos se pareçam com os antigos. O governo por meio de cacetes e pelotões de execução, de fomes artificiais, de detenções e deportações em massa não é somente desumano (parece que isso inquieta muitas pessoas, actualmente); é – pode demonstrar-se – ineficaz. E numa era de técnica avançada a ineficácia é pecado contra o Espírito Santo. Um estado totalitário verdadeiramente “eficiente” será aquele em que o todo-poderoso comité executivo dos chefes políticos e o seu exercito de directores terá controle de uma população de escravos que será inútil constranger, pois todos eles terão amor à servidão. (…)

(…)Abstendo-se simplesmente de mencionar alguns assuntos, baixando aquilo a que o Sr Churchil chama “cortina de ferro” entre as massas e certos factos que os chefes políticos locais consideram como indesejáveis, os propagandistas totalitários têm influenciado a opinião de uma maneira bastante mais eficaz do que teriam podido fazê-lo por meio de denuncias eloquentes ou das mais convincentes e lógicas refutações.(…)

(…)O problema consiste em fazer os individuo amar a sua servidão. Sem segurança económica, não tem o amor pela servidão nenhuma possibilidade de se desenvolver.(…)

(…)À medida que a liberdade económica e politica diminui, a liberdade sexual tem tendência para aumentar como compensação. E o ditador (…) fará bem em encorajar esta liberdade, juntamente com a liberdade de sonhar em pleno dia sob influência de drogas, do cinema e da rádio, ela contribuirá para conciliar os súbditos com a servidão que lhes está destinada.(…)”

Em “Admirável mundo novo” era preconizada esta sociedade 600 anos no futuro. Neste prefácio ele diz que provavelmente se enganou, que estaremos, talvez, a uns 100 anos dessa sociedade. Ele enganou-se de facto e em apenas 60 anos, é onde estamos.

Pensemos bem no que são as democracias ocidentais. De x em x anos os eleitores são chamados às urnas para escolherem um projecto político. Depois de escolhido, o que é que muda?
O que é que mudou, de facto, nos Estados Unidos com a eleição tão aclamada como uma mudança de paradigma do presidente Obama?
As tropas foram retiradas das zonas de conflito?
As pessoas responsáveis pela desregulamentação da economia americana que culminou com o estouro da bolha imobiliária e arrastou as economias mundiais para uma crise foram responsabilizadas por isso?
Do lado da Europa, quem é que escolhe quem está à frente das instituições? Quem é que escolhe o presidente da comissão e os comissários? Quem é que escolhe o governante do BCE?

A nível local, o que é que muda com a alternância entre os partidos do arco do governo? E mesmo que estes partidos fossem fortemente penalizados e fosse dada voz a partidos com projectos diferentes, o que aconteceria? Se olharmos para a Grécia, percebemos rapidamente que podemos fazer quase tudo, mas as elites no poder não deixam margem para quase nada. A Grécia, como a prazo Portugal, a Espanha, a Itália e a Irlanda terão de decidir o que fazer. Ou se conformam e espremem tudo o que podem dos seus cidadãos para tentar cobrir uma dívida causada pelo má gestão de dinheiros públicos, investimentos desnecessários e improdutivos, transferindo enormes fatias de dinheiro dos contribuintes para instituições privadas, ou não se conformam e vêem cortadas as fontes de financiamento à economia lançando os respectivos países num caos económico e social que, na melhor das hipóteses demorará anos a resolver e implica retrocessos graves no modo de vida de cada cidadão.

Não nos enganemos. Vivemos já num estado totalitário, tão bem maquinado e disfarçado que até temos a impressão que a realidade é diferente…

Numa ditadura temos, pelo menos, alguém a quem apontar o dedo.
E numa ditadura disfarçada de democracia em que ninguém é absolutamente responsável por nada?

As palavras de Aldous Huxley são proféticas. Era bom que as lêssemos e meditássemos um bocadinho no seu significado nos dias de hoje…



2 comentários:

  1. E seremos mais ou menos felizes por termos consciência do que acabas de explicitar?

    Abraço,
    FATifer

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  2. FATifer,

    A felicidade é um mero conceito. Ninguém no fundo é feliz, a não ser que seja profundamente estúpido.

    Fora isso, todos nós temos momentos de felicidade e de infelicidade.

    Ter consciência de algo não me faz mais feliz ou menos, mas pode contribuir para a minha felicidade caso eu esteja disposto a abraçar o que sei e agir de acordo.

    Mas, uma vez que já leste o "Conscientização", talvez tenhas a noção que a resposta à pergunta que me fizeste está na tua mão em forma de romance...

    :)

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O QUÊ?!?!? ESCREVE MAIS ALTO QUEU NÂO T'OUVI BEM!